42x13 Blur

Imagem: TingTing Huang

Eu te pedi que me machucasse.
Um de nós tem que fazer isso. É assim que essa história acaba.
Mas você me pediu que parasse de te pedir pra me machucar.
"Tem jeitos melhores", você disse.

Mas isso é tudo o que eu conheço.

Eu estou aqui,
mas eu não estou aqui.

Não aconteceu,
eu não estou acontecendo.
Eu não estou.

Eu acordo (eu sempre acordo)
Dirijo meu carro
Trabalho
Converso
Eu cuido
Dirijo meu carro
Deito na cama
E o dia acaba
E o dia começa

O mesmo dia?
Ou será outro dia?
Faz diferença?

Não faz.

É sempre o mesmo dia.

E eu sempre acordo.

Eu sempre dirijo

Mas eu não estou

Eu sinto todas essas sensações ao mesmo tempo.
Náusea.
Uma náusea absurda que toma todo o meu corpo e que não vem do estômago, vem de mim, vem das minhas costas e pernas e dos meus olhos e eu quero vomitar, mas
Tem dor
E cansaço

E eu quero vomitar,
eu quero chorar,
mas eu durmo

E dirijo

E as luzes, os carros, o despertador, as vozes, os rostos, os sons

É sempre o mesmo dia

Sempre o mesmo dia

Você sabe o meu nome?
Porque eu não tenho um.

Eu dirijo

E acordo

No mesmo dia
É sempre o mesmo dia

Sempre o mesmo gosto

As mesmas paredes

As mesmas dores

Eu dirijo

Eu dirijo

Eu dirijo

Eu dirijo

E acordo.

42x12 Birthday Cards

Imagem: TingTing Huang

Eu não consegui escrever antes. Escrever o quê? Pra quê? Por que?

Se eu pudesse, nunca mais sairia do quarto.
Eu esperaria até que o pé e as caixas cheias de nadas se empilhassem, me cobrissem. Eu fecharia as cortinas de modo a impedir a luz que me dá enxaqueca de entrar.
Abriria as janelas quando chovesse.
Gosto da chuva.
E abriria a porta pra você entrar. Entrar e me abraçar,
e depois partir, pro seu próprio mundo onde eu às vezes sinto medo de não me encaixar.

Onde às vezes eu não sei se quero me encaixar.

Meu aniversário. E eu só tenho histórias de outras pessoas pra contar.

Você me conhece?
O que você sabe?

Eu tenho 25 anos.
E ninguém me conhece.
Ninguém sabe qual é minha banana favorita.
Ou minha cor favorita.
Ou meu prato favorito, meus tênis favoritos, o nome do meu pai, o que eu desejo mais do que tudo, quem eu quero ser.
Ninguém sabe porque é que eu me afasto das pessoas. E nem quem eu vou afastar agora.
Ninguém sabe porque eu quero tanto ficar só.

Eu tenho 25 anos e nada pra mostrar.
Minto,
eu não tenho ninguém pra mostrar.
Uma concha, uma pedra, um pedaço de papel.

25 anos de conversas vazias.
De voltar pra casa e não sentir nada.
De sentir só por um instante fragmentado no tempo,
de me forçar a sentir.

25 anos de me sentir vazia.

Andar nas ruas desejando tudo o que eu não sou, tudo o que eu não posso ser ou ter.
Porque qualquer coisa é melhor.

Eu tenho 25 anos.

E não me lembro de ter me sentido de outra forma.

E eu tenho medo de que a vida seja só isso.

Vela na janela, eu faço vários pedidos vazios, porque eu não posso querer o que eu quero.
Eu não posso querer o que eu quero.

25 anos  e eu me sinto como um espaço vazio.
Eu me sinto como meu quarto: cheio. Transbordando. Caótico. Desprezível.
Se eu pudesse, jamais sairia dele.
Jamais sairia de mim.

Estou cansada.
Muito, muito cansada.

E ninguém me ouve, ninguém presta atenção.
Porque eu não tenho mais nada pra dizer.

Eu não quero mais falar.
Com você, com ninguém.

Eu tenho 25 anos.

Feliz aniversário pra mim,
de mim.
Ou qualquer coisa do tipo.