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Imagem: TingTing Huang

- Quero um anel mágico, que me faça viver pra sempre, ela diz, baixinho.

Olho para os meus próprios dedos - velhos, enrugados, manchados, tortos.

- Você vai morrer, - sussurra a voz das células que flutuam, despertas - porque não pode nos conter.
E eu ouço.
Ouço os ossos rangendo, abrindo caminho, ouço-as roendo, roendo, tentando perfurar.
Elas querem viver dentro de você, através de você, por você, com você, mas você não deixa.

Então elas tentam viver ao invés de você. Se escondem nas suas veias, cochicham entre si, pra que você não as encontre até o último segundo.

Elas veem pelos seus olhos, se alimentam pela sua boca pequena que beija e canta, elas comem tudo, famintas, vorazes, sedentas, até não sobrar mais nada. Até sobrar só você. Então, chega a sua vez.

A vez dos seus sonhos, esperanças, gemidos e de cada sensação, exceto a dor.

Mas não se preocupe, tudo tem cura. Você só precisa de um anel mágico, que te faça viver pra sempre.

Abro minha gaveta, cheia de anéis de plástico barato, escolho um pequeno, azul celeste e dou a ela.
- Aqui. É o último.

O rosto dela se ilumina e ela me agradece várias vezes, antes de sair.

Fico só.
Levanto da cadeira, tranco a porta e choro, sem lágrimas, por uns 2 minutos, até o horário da próxima paciente.

Ela entra,

- Quero um anel mágico, que me faça viver pra sempre.

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