Early Cuts: Peeler

Imagem: TingTing Huang

Velhos rascunhos de um conto jamais escrito pra uma pessoa que amei. (: Achei legal, quis publicar aqui. Vou publicando aos pouquinhos, caro leitor inexistente.

"Início do ano.
Existe algo de místico em começos e términos.
O começo do ano me assusta, particularmente. Parece trazer mil mudanças, rostos novos, nomes a decorar, parece demarcar a passagem inexorável do tempo, minha vida passando sem que eu tenha feito o que quis.
Me agarrei, naquele dia, aos pequenos fragmentos padronizados que me restavam.
Conversa amiga, algo me incomodada, naquele dia. Algo que só podia ser dividido com ela, a outra de mim: Elspeth.
Estava triste, arredia, entediada.
"Blasé", ela dizia, "você é blasé".
Elspeth é boa, Gentil. Amável.
Talvez eu esteja sendo redundante, você entenderia se a conhecesse.
Mas ela não é só isso.
Elspeth é inteligente, engraçada, espontânea, confiável. Ela tem um sorriso incrível que faz qualquer um sorrir de volta. Os olhos dela brilham permanentemente, parecem sorrir quase o tempo todo.
Tudo nela parece sincero, aconchegante, casa de vó.
Morro de medo de gente, mas Elspeth não é só gente. Ela é humana, em todos os sentidos lindos da palavra,
Eu poderia tentar descrevê-la fisicamente, se tentasse - embora não fosse sair parecido com ela, nem um pouco -, mas não importa agora.
O que você precisa saber, leitor, é que éramos quase inseparáveis.
Diferente das outras pessoas, Elspeth nunca me tratou como um robô. Pra ela, eu tinha alma, coração.
Eu era mais do que um amontoado de metal. E, pra mim, ela sempre foi mais do que carne, sangue, ossos.
Por isso, naquele dia, precisava falar com ela, e só com ela. Caminhamos juntas, envoltas numa bolha própria sob o sol, e eu divagava sem parar até chegarmos perto do templo.
E foi então que perdi a atenção de Elspeth momentaneamente.
Eram 4 forasteiros. Recém-chegados. Elspeth já os conhecia, trabalhava na prefeitura, numa posição extremamente importante. Pra ela, aqueles estranhos tinham significado.
Pra mim, eram carne, sangue, ossos. Ignorei-os, enquanto Elspeth falava com eles.
Eu não queria falar com eles, queria que me ignorassem, como estava acostumada. Preferia até que me temessem.
Três deles me ignoraram, como era certo.
Olhei pra eles com desinteresse e eles olharam através de mim.
Mas não ele.
Rosnou e me sorriu, disse algo à guisa de cumprimento.
Me viu.
Fiquei em choque, farejei o ar em busca de medo, de alguma explicação racional. Senti cheiro de euforia só, como era comum entre os forasteiros.
Olhei pra ele, híbrido de homem, leão, cavalo.
Não me lembro de responder, talvez tenha dito "Oi". Duvido muito.
Elspeth se desculpou por mim, não pela primeira vez, e voltei a me desinteressar deles até que foram embora e continuamos nosso caminho, nossa conversa, como se nada, nada mesmo, tivesse nos interrompido. "

0 comentários: