33x07 Lesões Elementares

Imagem: TingTing Huang

Infecção aguda.

Sinonímia: Ferida que dói e não se sente, contentamento descontente, dor que desatina sem doer, borboletas no estômago, aquela coisinha que eu sinto quando o celular avisa que chegou mensagem.

Etiologia: Às vezes é vírus - tratamento sintomático e repouso dão conta do recado, mas nem sei ao certo - Às vezes, fogo puro, pus, tratamentos longos e arriscados, aquele medo de criar resistência, de nunca mais sarar.

Reservatório: passa pra homem, passa pra bicho, passa pra mim e eu vou passando pra hospedeiros acidentais no caminho, e sendo hospedeira acidental de amores que não duram nem uma tarde, de amores que duram anos, de amores que eu ainda nem sei quanto duram, que nem sei se acabam.

Modo de transmissão: Pessoa a pessoa, por contato direto, aquele tocar as mãos, aquele almoço de sábado, beijo de língua. Passa por contato indireto também, olhares, sussurros, a leitura do meu livro favorito, umas palavras ditas ao acaso.

Período de incubação: Variável. Tem gente que tem e nega por muito muito tempo, fica por aí, assintomático. Pode ser de 1 dia, 1 segundo, 1 mês, 1 ano, muuuitos anos até.

Período de transmissibilidade: Ah, meu bem, enquanto houverem lesões, a infecção é possível.

Quadro clínico: Primeiro, surge assim, meio bobo,  feito exantema de aspecto máculo-papular, e vai se distribuindo pelo corpo. Começa na cabeça, feito uma manchinha pequena, depois já está lá no estômago, causando borboletas.
Após algumas horas (às vezes mais do que isso), adquire aspecto vesicular, evoluindo rapidamente para pústulas e, posteriormente, formando crostas em 3 a 4 dias. Muda de forma tão rápido que você mal percebe, cresce e se altera. Quando você vê, o álbum do Angus e da Julia já tocou no repeat umas 18 mil vezes e você nem percebeu que o tempo tinha passado.
Ah! Também coça. Coça. Coça. Coça tanto que parece que você vai enlouquecer.
Coça tudo, até a língua, que coça mais ainda quando você quer dizer algo que não seja idiota, mas parece que as palavras se perderam no caminho, parece que a boca perdeu o contato com o cérebro e você só consegue dizer coisas banais, como "Parece que vai chover, eh?"
Pode ocorrer febre moderada e sintomas sistêmicos. Pernas bambas, mãos geladas, taquicardia, as pupilas dilatam, e aquela vontade de estar junto o tempo todo.
A principal característica clínica é o polimorfismo das lesões cutâneas, que se apresentam nas diversas formas evolutivas, acompanhadas de prurido e de vontade de ficar junto pra sempre.
Em crianças, geralmente, é uma doença benigna e auto-limitada. Mas quando se é adulto, pode até durar pra sempre.

Complicações: Pode haver infecção secundária, confusão mental, vontade de ouvir Taylor Swift e de ficar de mãos dadas. Ah, cuidado, imunodeprimidos: Às vezes chega sem avisar, com febre altíssima, lesões polimorfas e pode até ser letal, ainda mais quando não é correspondido, ou quando não acaba bem. Ou quando acaba sem acabar de verdade.

Diagnóstico: Principalmente através do quadro clínico- epidemiológico.
Às vezes, dá pra saber de cara. Mas, às vezes, só dá pra confirmar com uma boa dose de conversa, observação ou álcool mesmo.

Diagnóstico diferencial: Tem gente que confunde com constipação, gente que confunde com amizade e gente que confunde com não querer ficar só. Há que se diferenciar direitinho, porque os tratamentos são bem diferentes. O que cura um, não cura o outro.

Tratamento: Ah, complicado dizer, complicado entender e aceitar. Tratamento sintomático, esperar passar. "E se não passar?", você me pergunta. E eu direi que passa. Confia em mim: passa. Os autores concordam que passa, até Byron disse que passa.
É, eu sei, Drummond disse que às vezes não sara nunca.
Mas confie em mim, passa.
Às vezes, parece que não vai passar nunca. Ataca o corpo inteiro, queima por dentro, devora tudo, grave, complicada,
aí passa.
Às vezes, fica uma ou outra cicatriz, pra guardar de lembrança.
Às vezes, nem isso.

Vacinação: Você pode até se vacinar, todo ano, todo dia, toda  hora. Quando a forma grave vier, não vai fazer a menor diferença.
Tem gente que acha que só se pega de verdade uma vez na vida, gente que afirma categoricamente que já pegou muitas e muitas vezes, de muitas formas.
Eu não digo nada.

E, ah,
não é doença de notificação compulsória.
Mesmo assim,
notifique, por favor.

Dissemine, por favor.

Contagie-se.

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