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Imagem: TingTing Huang

Fiquei olhando as estrelas.
A fachada do prédio, as casas da frente.
As pessoas passando pela rua, o cheiro.
Os carros parados, as placas, as plantas.

E nada me pareceu familiar, nem mesmo os seus ruídos.

Nem os lugares onde eu costumava estacionar, a calçada, as luzes.
Fiquei me perguntando o que é que eu tanto olhava quando ficava lá fora, esperando, em que é que eu pensava mesmo?

Coisas de amor, provavelmente.

Enquanto você não descia, eu me dei conta de que só queria ir pra casa comer.
Mas que houve um tempo em que eu nem sentia fome.
Eu só queria estar ali.

Bateu uma tonteira, uma sensação de estar fora da realidade, por um segundo. Não a sensação de estar perdida, mas a sensação de que eu estava tentando lembrar de algo que nunca tinha acontecido.

Pensei em Lean On, que tinha começado a tocar minutos atrás, e como essa música tinha sido um dos hinos das minhas mágoas, a música que eu tinha escutado bêbada, no meio de tantas madrugadas a procura de um gosto parecido com o da sua boca. Pensei em como era só uma música, como eu tinha uma playlist completamente diversa, limpa: feliz, de garota crescida.

Pensei no meu melhor amigo, e no meu outro melhor amigo. Pensei em como eu cheguei no fundo do poço meses atrás, como eu fui capaz de fazer de tudo pra não pensar nisso. Eu sempre soube que, em algum momento, iria parar de doer. Mas eu não achei que realmente fosse acontecer.
E confesso que isso me deixa confusa.
Parte de mim tem medo de ficar perdida sem isso, sem essa dor, sem essa história, sem drama.
Mas grande parte de mim já cansou.

Eu olhei pr'aquela casa que sempre esteve lá na frente do seu prédio e não a reconheci. Será que eu já tinha mesmo olhado pra ela?
Disse isso a L., e ela me disse que era porque eu tinha "olhos novos".

É, olhos novos.
Eu não sou a mesma.
Eu não me sinto doente. Eu faço escolhas, pequenas, e decido não fazer algumas delas.
Eu QUERO ler na ordem. Eu GOSTO de assistir seriados em ordem alfabética. E foda-se se eu quiser assistir fora da ordem. Eu posso. E quem decide sou eu.
Eu gosto de sair. Gosto de dançar. Gosto do gosto do álcool, da sensação de entorpecimento. Gosto de abraços. Não tenho cabelo, gosto desse cara - mas nem tanto assim -, de cinema, gosto de ficar em casa, eu sei tanta coisa, eu sou capaz de tanta coisa.
E é por isso que eu não enxergo mais o que eu costumava enxergar. Isso me deixa angustiada, mas feliz.
Eu não sou mais a mesma.
Eu posso ter arruinado tudo, ter acabado com a gente, ter sido a maior filha da puta da galáxia, mas eu não a mesma.
Eu tenho olhos novos.
Aprendi a opinar, e a chorar de vez em quando.
Aprendi a amar minhas amigas e a detestá-las também.
Tanta coisa, tanta
É o que passa pela minha cabeça dolorida,

e você desce, com os papéis na mão.
E eu te vejo pela primeira vez, com meus olhos novos
E percebo que gosto de você. Você tem seus defeitos, mas fez muito por mim. Você cuidou de mim, você esteve lá pra mim também.
Eu gosto de você, muito.


Mas não te amo mais.

Isso me desestabilizou por um instante, e eu senti vontade de usar meus olhos velhos, de te amar sob as estrelas e te enxergar com meus olhos velhos, aquela mágica, aquele cheiro de limão, tão poético, tão bonito.

Mas passou rápido.
É melhor assim. Não tenho mais o poder de te machucar. Eu não estou machucando ninguém.
Estou aprendendo a gostar de mim, me conhecendo melhor, fazendo coisas, não fazendo coisas.
E espero que você esteja fazendo o mesmo.

Loucura, é.
Mas acho que, finalmente, eu só espero que você esteja bem.

O resto, bem,
Não é da minha conta.

Não mais.

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