39x06 Mais um texto sobre paixão dedicado à pessoa errada

Imagem: TingTing Huang

(N.A.: Eu não consigo parar de escrever sobre esse cara. Tô obcecada por ele, como vocês podem ver. Não acho isso ruim, acho muito bom, a sensação é boa pra caralho - por enquanto. Vou esperar passar. Enquanto não passa, escrevo)

Acordo cedo, cedo demais, o dia ainda escuro, deitada no sofá, e já tô pensando em nós dois.
Será que tem como a gente sair agora, fugir pras colinas e se esconder atrás de uma árvore pra rir de alguma coisa que só a gente entende?

Você dá uma risada no meio da tarde, o sol queima a minha pele e andamos de bicicleta tirando as mãos do guidão, você parece um adolescente, eu já tô velha demais pra isso, não?
Você me responde que a gente nunca vai ficar velho demais pra isso, aí andamos de patins.

Eu te explico que não sei cozinhar, mas a gente inventa um prato novo, feito de macarrão e tomate, o gosto fica horrível, mas você come sem fazer careta. Você acena com a cabeça e eu acho muito engraçada a forma como você não consegue mexer apenas a cabeça, tem que mexer o corpo todo.
- Aaaa você é muito desengonçado, que agonia!
Você não responde à ofensa, só sacode a cabeça (e o corpo) e sorri, como se dissesse "olha quem fala", e eu sinto uma ternura tão grande por você, tão grande, que fico meio emocionada e finjo que tô lavando a louça, pra não demonstrar demais.

A gente fica tanto tempo sem se ver, por que a gente fica tanto tempo sem se ver? Por que pessoas legais não moram perto mesmo?
Invento que a gente enjoaria um do outro, mas você acha que não, diz alguma coisa que não tem a menor graça, mas que é engraçado porque eu tô apaixonada por você. A verdade é que também acho que não, mas morar longe tem suas vantagens, tipo essa
chegar em casa feito uma maluca descabelada e você tomando sol no nariz, sentado na minha porta com essa mala cheia de tralhas e de camisas amassadas, bermudas jeans e outras coisas aleatórias, tudo tão brilhante e limpinho, a gente se abraça tão forte e você cheira tão bem, tão bem que o meu dia pesado, minha vida caótica, tudo some
e eu fico só no mundo, só com você e com seu cheiro de branco, seu gosto de saudade.
A gente sobe as escadas e eu só quero nunca mais soltar sua mão.
Meu Deus, eu quero nunca mais soltar a sua mão, que coisa assustadora gostar tanto de alguém assim.

Você já dormiu, mas eu não.
Eu tô te olhando, e isso é meio esquisito, meio assustador.
Teu cabelo cai no rosto e se move com a sua respiração, mas eu não tiro.
Eu tô pensando,
eu tô tentando entender, tentando racionalizar, tentando não me jogar tanto pra cima de você
mas no meio desse processo eu não consigo deixar de ver a poesia na sua pele, na maneira como seus olhos se fecham, nos fios da sua barba que nem barba é, nos seus pés que teimam em ficar fora das minhas cobertas limpas, tem alguma coisa em você, alguma coisa diferente de tudo o que eu conheço, de tudo o que já conheci, de tudo o que já houve no mundo, alguma coisa que não é
Porque o que eu tô sentindo não é normal.
Estendo a mão pro teu peito magro e ponho a mão em cima do seu coração.
O teu eu adormecido se move, resmunga e põe a mão em cima da minha.
Adormeço.

Pensei nos nomes dos nossos filhos.
Foi involuntário, estava te olhando brincar de aviãozinho com o teu sobrinho e imaginei nosso filho com cabelos enroladinhos, me imaginei cantando pra ele com minha voz desafinada, enquanto você tenta me explicar essas tuas coisas malucas e maravilhosas, me diz pra não parar, não paro, porque isso é a vida acontecendo.

"Tá ouvindo essa música?", eu pergunto.
Você tá distraído, olhando pela janela, olha pra mim, meio assustado.
Você tá me escondendo algo.
E isso não me perturba, por alguma razão bizarra.
Coisa tua, vou ficar sabendo quando e se tiver que saber, você me pergunta que música é e eu te explico a história e o quanto gosto dela.
Você só fica acenando com a cabeça (e o corpo, haha) e se vira pra olhar pro céu azulzinho, fica calado de novo.
- Tá tudo bem?, pergunto, preocupada.
Aí você olha pra mim, vai piscando os olhos de mansinho, o seu rosto todo se abre, se ilumina, de um jeito que só você consegue fazer, como se tivesse tido uma grande ideia, quase como quando uma música te surge no meio da noite, no meio do almoço de domingo, seu peito infla e eu tô com medo do que você vai dizer, mas tô ansiosa também, eu não sei o que vem por aí, mas eu quero o que vem por aí
Eu quero o que vem por aí, seja o que for.

Seja o que for.

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