39x08 Too much to ask

Imagem: TingTing Huang

Minha cabeça está cheia de segredos.
Ando misturando histórias,
esqueço fatos,
eu sei coisas demais sobre as pessoas,
e os meus próprios segredos escorrem pelos meus dedos enquanto durmo.

Tenho essa sensação ruim, constantemente.
Sensação de não ter feito algo,
o peito apertado,
ou será que eu fiz algo que não deveria ter feito?
Eu disse algo errado?

Não consigo dormir.
Fico pensando, pensando, remoendo seus segredos e como eles afetam as outras pessoas.

L. enfia uma chave de fenda gelada no meu ouvido direito,
aperta uns parafusos,
fumamos um cigarro,
tomo uns comprimidos
e me sinto aliviada porque ela não tem nada novo pra dizer,
porque ela está morta.

- Eu tô morta? Essa sensação de estar saindo do meu corpo, quer dizer que estou morta? Eu nunca sei.
Ela dá de ombros, eu pego meu celular pra fazer alguma burrice, mas eu não sinto vontade de fazer nada. Devo estar mesmo morta, porque não encontro nada pra fazer e falar com você é a última coisa na minha mente.

Tem algo errado, mas não é o de sempre, eu acho.
É uma sensação.
Eu tento explicar a L. que não é a mesma coisa de antes, é diferente.
É como se eu não fosse real.
Não tem a ver com estar morta, ou tristeza, ou com o que aconteceu naquelas noites, eu acho.
Mas eu sinto como se nada disso estivesse acontecendo.

- Está acontecendo? Prove que está acontecendo. Mostre algo, faça algo.

Mas ela só sopra fumaça no meu rosto e me manda calar a boca e parar de ser tão maluca o tempo todo, e eu me deito na grama, sem saber se tô acordada ou se tô dormindo, se esses últimos meses realmente aconteceram ou se eu imaginei tudo,
se eu imaginei janeiro,
e ainda estou deitada na cama da minha avó em dezembro,
ansiosa pelo início desse ano,
pelas possibilidades

Talvez depois eu reflita e perceba que as coisas tinham que ter acontecido dessa maneira, que eu precisava --
mas a sensação de estar dormindo, de que isso é tudo um sonho
é boa,

boa demais pra desperdiçar.

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