21x10 North Egg

Imagem: TingTing Huang

Estavam destinados a se conhecer e se apaixonar. Eram perfeitos um pro outro: ela escrevia novelas no caderno, ele roteiros de filmes no computador, separados pela divisória da mesa do mesmo café.
De manhã, ele fazia cursinho, o mesmo que ela fazia à tarde.
Nos fins de semana, iam à biblioteca, ela sentava na cabine, de costas pra mesa onde ele lia.
Esperavam o ônibus no mesmo horário, no mesmo ponto. Ela esperava no sol, ele na sombra, atrás do ponto. Ele pegava o 16, ela o 22.
Ele fazia compras na quarta de manhã, ela na quarta à tarde.
Passaram na mesma faculdade, ela de manhã, ele à tarde.
Liam os mesmos livros, escutavam as mesmas músicas.
Ela tinha medo das mesmas coisas que ele tinha aprendido a enfrentar.
Ela conhecia as coisas cujo significado ele nunca entendera.
Seus signos eram perfeitamente opostos, completavam-se.
Gostavam de azul e blusas de frio. Ele bebia água demais, ela de menos.
Ficaram doentes na mesma semana e foram internados na mesma ala.
Receberam alta no mesmo dia.
Almoçavam no seu restaurante favorito: ela em uma janela, ele na outra, extremos opostos.
Ele saía de casa às 7:23 e passava pelo mesmo lugar em que ela passava 2 minutos depois. Pedalava pelas mesmas ruas pelas quais ela caminhava cabisbaixa.
Arrumou uma namorada que o fazia feliz, mas não o bastante. Ficou noivo.
Ela foi ficando sozinha, cada vez mais fechada para o mundo.
Ele se casou e arrumou um bom emprego, 2 andares acima do lugar onde ela trabalhava semanalmente.
Ela teve um filho com um namorado. O relacionamento não deu certo.
Ele se divorciou, sem filhos. Teve outras namoradas que não duraram muito. Ela foi à alguns encontros, mas sempre voltou pra casa sozinha.
Um dia, acordaram, o tempo parecia estar acabando e eles aceitaram que a vida era só isso - não valia a pena e a dor de ser vivida.
Ele estava no trabalho quando sentiu dores no peito. No mesmo dia, a irmã dela adoeceu.  Chegaram juntos ao hospital, ela de carro, ele de ambulância. Ela deu passagem para a maca, encostando-se na parede do corredor e ficou olhando enquanto ele era levado.
Ele não morreu, por pouco.
Saiu do hospital se sentindo velho, cansado e solitário. Estava assustado com sua própria fragilidade. Pegou um táxi e foi até a torre da cidade, seu lugar favorito em criança. Queria pensar, queria voltar no tempo.
Ela tinha medo de altura, mas o filho queria tanto ver a cidade lá do alto...
Entrou no elevador com uma mulher e uma criança.
- Mãe, você tá com medo? - perguntou o menino.
- Sim, mas tudo bem ter medo.
- Por que?
- Se eu nunca tivesse medo de nada, como é que ia saber quando estou sendo corajosa

Ele olhou pra ela e sorriu.
Ela sorriu de volta.
Em tempo.   

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