Imagem: TingTing Huang
Estive seguindo a mulher que amo.
Porque eu a amo, e não tem outra forma de escrevê-lo.
Eu a amo.
Ela acorda todos os dias, e eu a ouço acordar, do apartamento ao lado.
Eu a ouço colocar música pra tocar, canções alegres ou tristes, a depender do seu humor.
Eu a ouço tomar banho e imagino seu corpo nu e molhado.
Eu a ouço destrancar e trancar a porta, e seus passos ecoam no corredor e nas escadarias até desaparecerem no vento cortante da manhã, após a batida da porta de metal que nos separa do mundo lá fora.
E então eu desço.
Já estou pronto desde cedo, desde antes das 5, insone, triste, ansioso, desesperado, sóbrio de uma forma nova e intensa.
Saio sem bater a porta, e caminho sem correr.
Eu sei pra onde ela vai.
Eu sei quantos passos ela dá até o ponto de ônibus e sei que ela vai tomar um café barato e doce antes de mais nada, pra começar bem o dia.
Eu sei que ela vai se encolher quando o vento estiver forte demais, e prender os cabelos quando estiverem sujos.
Cabelos negros, brilhantes, fortes, longos, com cheiro de xampu de maracujá que eu sinto no corredor quando o banho dela leva mais do que 5 minutos.
Ela entra no ônibus, e eu entro algumas pessoas atrás, caminho até o fundo, como se ela não existisse, como se ninguém existisse.
Sacoleja o ônibus, sacoleja meu estômago com a proximidade entre nós.
Eu estou aqui.
Ela está aqui.
Alguém se levanta e ela senta, mas não sem antes olhar para os lados, à procura de alguém que precise se sentar mais do que ela.
Seus olhos quase encontram os meus, por um milésimo de segundo, mas eu desvio o olhar para algum prédio estúpido.
Ela abre o livro,
o livro que eu deixei na caixa de correio, endereçado a ela, sem dedicatória, sem remetente, nada,
e meu coração saltiteia.
Sinto minha pele queimar quando ela passa as páginas, como se eu fosse o livro, como se o livro fosse eu.
Consigo me sentar, finalmente, e fico atento às paradas, ao céu azul e limpo, pessoas nas ruas, correndo, se apressando,
sem saber o que é amor,
sem saber o que é amar.
Uma parada antes, eu desço e me apresso, corro, aproximo os metros que nos separam.
E ela está lá.
Cabelo balançando, blusa de frio fechada até o pescoço,
e os olhos,
os olhos.
Conversa com a melhor amiga, de quem já sei absolutamente tudo, enquanto eu observo, de longe. Elas riem, em alto e bom som,
e eu só quero rir também, eu só quero fazê-la rir, eu quero abraçá-la e aquecê-la, levá-la pra casa pela mão.
Eu quero saber como foi teu dia, mas você se fecha,
desaparece,
e volta com algum cara que eu torço pra não ser o mesmo de sempre,
vocês brigam e ele vai embora, mas volta.
Eu quero cozinhar pra ela,
fazer o café,
podemos até discutir política, eu te ouço discutir, eu te ouço brigar com a televisão.
As risadas morrem aos poucos, enquanto as duas entram no prédio.
Acendo um cigarro, trêmulo,
desajeitado.
Sou um maluco,
um puto psicopata desesperado, errado, completamente louco, um merda.
merda.
Olho no relógio.
Ela sai pra almoçar às 13. Faltam 5 horas.
Fico na dúvida se volto pra casa ou se espero.
Ela está bem.
Vai ficar bem.
É o que importa, certo?
Volto pra casa,
leio,
escrevo, ansioso, perturbado,
fumo,
fumo, fumo
desesperadamente.
Estou arrependido de tê-la deixado só, de tê-la deixado voltar sozinha
Qualquer coisa pode ter acontecido.
O mundo é cheio de gente ruim,
de gente doente.
Pego o celular, pego dinheiro, eu vou atrás dela,
eu preciso ver se ela está bem,
abro a porta e
ouço a porta de ferro bater.
Passos nas escadas.
Fecho a porta e prendo a respiração;
até ouvir os passos passarem pela minha porta, pararem na dela,
chave na fechadura
e eu posso respirar, com o ouvido colado na parede.
Tô ficando louco.
completamente louco.
Acendo meu último cigarro do dia,
e me sento perto da tua parede, enchendo a sala de fumaça,
pra te ouvir caminhar, e fazer o que quer que você faça,
até você dormir,
pra eu poder dormir
e sonhar com você,
dias melhores,
tua mão na minha
abrir a porta,
te encontrar no corredor,
dizer meu nome,
perguntar o teu
sair pro mundo lá fora contigo.
Nem atrás, nem na frente:
do teu lado.
Boa noite, Berenice.
Até amanhã.
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