Imagem: TingTing Huang
Domingo à noite, doente, perdida em uma nuvem de dor, ele liga e me convoca pra lutar.
Tomo pílulas e pílulas, antiinflamatórios, analgésicos, antitérmicos,
vou à luta.
Eu não tô OK.
Meus ouvidos escorrem, garganta dói, meus olhos coçam.
L. me põe remédio debaixo da língua e eu derreto, escorro pelas frestas do chão até passar o efeito.
Mas, quando ele passa,
eu não sou.
Não reconheço meu rosto ou a textura seca dos meus cabelos.
Eu não sou.
Digo isso a L. e ela me diz que tô doente, que não posso voltar pra casa.
Pego o carro e dirijo sem parar, sem dormir, compro sorvete e espero o sol nascer, sentada no carro num lugar qualquer, com medo de tudo o que existe no mundo, com medo de ir pra casa e não me sentir em casa, com medo de L., com medo de jalecos brancos, agulhas e ressonâncias. Com medo de canetas e
Minhas costas sangram e eu me obrigo a usar camisetas escuras de algodão, que roçam permanentemente nos machucados, fazendo com que me lembre que estão ali.
Paro na porta da sua casa antiga e te espero voltar, pergunto pra um homem na rua se ele te conhece, mesmo depois de tantos anos.
E ele diz que não.
Eu tô ficando louca.
Ou será que não?
Ou será que sim
Uma gata de pelos dourados fala comigo nas ruas e me conta todo o meu futuro, mas eu me esqueço assim que ela vai embora.
Eu me esqueço rápido.
Assim como me esqueci de que te amava na semana passada.
Porque agora odeio tudo
e todo mundo.
Odeio, odeio.
e não consigo explicar,
eu não consigo encostar a minha boca na sua
eu não consigo sentir dor
eu não consigo levantar de manhã
eu não consigo conseguir
Arranco meu olho direito e sangro, no canto mais escuro da minha mente.
Alguém fala comigo, muita gente fala comigo,
o tempo todo
e eu não quero falar.
E elas não me deixam não falar.
Por que é que as pessoas teimam em saber mais de mim do que eu?
"Você consegue ver isso aqui?", eu grito, enquanto enfio os dedos no buraco do olho e arranco de lá o que me faz ser assim tão errada. "VOCÊ CONSEGUE VER A PORRA DESSE NEGÓCIO? Você não sabe de porra nenhuma sobre mim, então não me venha com diagnósticos baratos e seus clichês estúpidos"
Mas eu não falo de verdade,
eu me calo no canto do carro.
Eu nunca mais
Não quero mais falar.
L. me pergunta o que há de errado comigo, bate no meu rosto com os dedos gelados, molhados, me diz que já é segunda à noite, que eu tenho aula pela manhã, enfia os dedos na minha goela, mas eu não tomei nada.
Eu não tomei nada, eu tô é toda fodida, bem aqui ó.
Eu não quero morrer, L.
Seguro as mãos dela, mas já não consigo
não quero mais falar.
Eu não quero morrer, L.
Eu quero que o tempo pare,
eu quero que as pessoas parem.
Mas já é segunda à noite,
e eu tenho aula pela manhã.
33x15 Going Rogue
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