35x07 A Freudian Nightmare

Imagem: TingTingHuang

No meio da noite, acordo, fraca, o rosto úmido de sangue que jorra do nariz.
Eu sangro.

Metal, ossos
Não há lugar para fraqueza.
Estanco o sangramento e vou à luta.
Eu levanto da cama,
eu sorrio,
eu conto piadas e histórias longas,
eu estudo,
volto pra casa
e sangro.

Sangro pelos olhos,
nariz
boca.
Sangro pelas orelhas,
vagina,
e ânus.

O sangue coagula debaixo das minhas unhas,
e suja minha comida,
minha cama,
minhas calças.

Digo a ela,
eu não sou humana,
como posso sangrar tanto?

E ela não sabe a resposta.
Mas eu sei que, de alguma forma,
isso tinha que acontecer.
Eu preciso sangrar.

"Talvez você esteja se tornando humana, B. Ninguém vive só de metal e ossos", diz L.
Talvez eu esteja,
talvez eu esteja melhorando.

Começo a pensar sobre as coisas nas quais não penso.
Eu consigo sentir.
Morte, fracasso, estar no lugar certo, amor cru.
Eu sonho.
Viver dói, e eu sinto.
E sigo em frente, deixando um rastro de sangue no chão.
Dói muito,
e eu não escondo, eu choro por dias a fio.
Porque a dor é pra ser sentida,
não é?

Ela vem de longe, sente o cheiro do meu sangue,
do sangue que não deveria existir,
do sangue que ela não planejou.
E eu digo a ela
que estou triste.
Eu sei o que é estar triste,
e estendo as mãos,
eu sei.

E é nesse momento que ela me corta.
Primeiro as mãos
Depois os braços
Seios
Pescoço
e ela dilacera meu rosto
rasga todo o meu corpo
pra me mostrar que tristeza é fraqueza.

Corta minha língua,
meus sonhos
e meus planos
em pedacinhos pequenos que não consigo juntar.

Ela não me fez pra ser humana
fui criada pra ser robô, metal e ossos
então ela espera, em silêncio, até que a última gota de sangue jorre
toda a vontade,
toda a luta,
toda a vida.

E, mesmo quando tudo sai,
ela continua cortando
e cortando
e cortando
cada conduto
pra se certificar de que não tem volta.

Sussurra nos meus ouvidos as palavras mágicas
e me convence de que
quem eu sou não tem importância
o que eu quero não tem importância
eu sou fraca
e nesse mundo não tem lugar pra fraqueza.

Pega suas malas, desce as escadas
e me deixa pra trás
limpando o chão sujo de sangue
tentando não acreditar
tentando desesperadamente não acreditar,
ao mesmo tempo em que repito pra mim mesma tudo o que ela acabou de dizer,
como se fossem verdades absolutas.

Que é o que são,
certo?

Certo.

0 comentários: