Imagem: TingTing Huang
Bate à porta.
Abro, devagar, deixando a luz entrar aos pouquinhos. Não é você.
- Pai.
Long time no see.
Deixo que ele entre na casa escura, cuja única fonte de luz é a tela do computador.
Indico o sofá, e nos sentamos, lado a lado. Assistimos Homeland.
- Como vai você?
- Ok. - digo, sem desviar meus olhos da tela - O que você quer?
- Ver minha filha favorita?
- Você diz isso pra todas. - digo, mas ouvir isso sempre me traz uma espécie de satisfação infantil.
Ele acaricia meus cabelos, num cafuné desajeitado e incrível, que me faz sentir em casa.
Que me dá uma vontade gigantesca de chorar.
- Você me deixou sozinha. Eu não sabia o que fazer e você não estava aqui.
- Você tentou falar comigo?
- Não. Mas você sempre sabe tudo, você sempre sabe, e me deixou aqui. Eu não conseguia respirar. Eu não conseguia fazer nada.
- Eu sei.
- Você podia ter me deixado um recado, você podia ter feito tanta coisa. Se você estivesse aqui, talvez-- Talvez nada daquilo tivesse acontecido. Talvez estivesse tudo ok.
- Eu sei.
- Eu tô tão perdida, eu não sei mais o que é certo e o que é errado, eu não quero mais ter que dizer nada ou fazer nada, eu tô cansada e eu precisava de você aqui.
- Eu sei.
- Mas você não veio. Ninguém veio. E eu não sabia pra onde ir.
- Eu sei.
- Mas eu consegui me sentir melhor. Não, melhor não. Mas doeu menos. Eu consegui algumas distrações haha. Um monte de seriado, na verdade. Tantos, tantos, tantos. Você não estava aqui, mas eu tive uma noite tão horrível, e eu achei que a dor não fosse passar nunca, eu achei que não ia conseguir, mas... Uma temporada inteira de Downton Abbey depois, e eu tô aqui. Então, sempre que dói, sempre que dói muito e eu acho que não vai dar, eu só faço isso. É estúpido, mas dói menos, eu juro. Você não estava aqui, você não veio, então eu resolvi tudo sozinha.
Deito a cabeça no ombro dele, certa da minha própria força, certa de que consegui sozinha todos esses meses, um pouco triste por não precisar mais dele, do meu velho pai, pra me ajudar a continuar.
Ficamos em silêncio até o episódio acabar, aí ele me beija na testa e vai saindo devagarinho, me deixando de novo. Vai até a porta, para.
- Eu tô feliz, B. Por você ter chegado até aqui sozinha. Sem pedir minha ajuda. por estar conseguindo se encontrar aos pouquinhos.
Pausa. Sorri, daquele jeito espertinho.
- Mas você sabe que fui eu quem pagou as contas do Netflix, né? (:
Assinar:
Postar comentários (Atom)
0 comentários:
Postar um comentário