Imagem: TingTing Huang
Tudo deveria ser fácil, simples.
Amor e etc.
Eu queria poder olhar nos teus olhos e te dizer que acabou, assim, só dizer e dar as costas à nós dois, pra todo o sempre, sem me arrepender.
Queria então te beijar a boca e me jogar sobre o teu corpo, sem medo, como se o meu amor por você fosse suficiente pra te fazer me amar.
Mas não: ora te amo, ora te nada, ora amizade, ora esquecimento, ora tô com medo de seguir em frente, ora só quero seguir em frente.
Daí rodopio nesse eixo de nós dois, e nada acontece, nada nunca acontece.
"Me deixa ir.", eu quero te dizer, "me deixa ir pra sempre e vê se para de me machucar com sua presença constante".
Mas não digo,
eu não sei te deixar ir.
Eu queria poder bater na tua porta, Meu Grande Amor, com um discurso pronto.
Eu te amo, eu sempre amei, eu sempre vou amar,
e não quero nada da vida que não envolva você e eu.
Desde que você foi embora, tô me sentindo meio sem rumo, meio sem chão, meio não-eu.
Me deixa entrar e passar a noite, me deixa passar o dia, cozinhar pra você, cuidar do teu resfriado e dos seus machucados, como a gente fazia antes.
Me deixa abraçar tuas costas brancas cheia de pintinhas e desenhar nosso futuro em cima das suas escápulas.
Eu queria me declarar pra você de um jeito novo, único e incrível, de joelhos na chuva, ou com a ajuda de uma fanfarra, quero ficar sentada, boquiaberta, enquanto você seca os cabelos depois do banho.
Quero viver de olhar pra você.
Mas não: eu tenho que te deixar em paz, como combinamos. Cada um pro seu lado, cada um com sua metade da cidade (eu norte, você sul).
Você precisa de espaço, de tempo pra curar as feridas de nós dois, e eu preciso aprender a me afastar também.
Pego o telefone, finjo que sei teu número, quero te ligar e dizer que ainda te amo, que sou tua, objeto largado pra trás na casa vazia que a sua voz preenchia com luzes de Coppolla.
Penso em bater no seu apartamento antigo no meio da noite, perguntar aos vizinhos pra onde estão mandando suas correspondências, e minha cabeça dói, explode,
e eu não saio da cama,
porque tenho medo
de nunca mais te ver ou
de te ver e não sentir mais nada.
Eu queria, Martin, destruir tua vida.
No bom sentido, é claro.
Queria quebrar tuas pernas com minha mania de amar as pessoas de um jeito todo meu. Queria te chamar pra um café com torta de frutas vermelhas,
beijar sua boca da maneira mais pura e casta pra não te assustar.
Queria até te levar ao cinema e, quem sabe, pegar na sua mão.
Eu queria te mostrar umas músicas que já considero um pouco tuas,
e discutir com você pra saber o que acontece com a doçura na tua voz quando você fica bravo.
Queria te mostrar meu mundo cheio de sol e cinza e tirar seus óculos quando fôssemos dormir.
Ô, Martin, eu queria dizer foda-se a tudo que aprendi no último ano e te chamar de meu.
Queria não me importar com minha personalidade terrível, meu medo de me envolver, minhas neuroses (e psicoses) e te chamar pra sair, pra andar por aí na noite escura e tocar suas costas nuas.
Quero te deixar furioso e te beijar nos corredores brancos, te trazer pra minha casa no meio da noite e te assegurar de que gosto mesmo é de você, do seu cheiro, da sua voz e das suas manias esquisitas. Talvez até dos seus chinelos, que Deus me perdoe.
Mas não faço nada disso: não te convido pra um café, não seguro a tua mão. Eu observo.
E você está bem.
Você vai ficar bem sem mim, muito bem, sem essas incertezas, sem essas brigas, sem esse desastre que eu sou.
Vai ficar bem, Martin, sair ileso: nem equimoses, nem luxações, entorses, fraturas, rupturas, hematomas. Vai ficar bem, meu bem.
E não sei se posso dizer o mesmo de ti, moço, te escolhi pra bode expiatório do meu amor sem nome, sem direção, sem propósito.
Estava em casa contida, esperando um grande amor bater a porta e me punir pelo mal que tenho causado, quando você me mandou mensagem, esperando um "não", o de sempre.
Não,
dessa vez é sim.
Pra tanta coisa que você nem faz ideia.
Saímos e eu já sei como termina, mas você nem faz ideia. Tudo isso é truque, um jogo tão bem criado que você nem sabe que está jogando.
Eu faço as regras, e minhas regras não são as regras usuais, você tira a camiseta preta no escuro e
eu consigo ver a delicadeza do que quer que seja isso,
a delicadeza das coisas que não serão.
Deixo minhas roupas no chão, num lugar qualquer, junto com o significado do que quer que acontece quando você me pede pra ficar mais um pouco.
Peço as desculpas de sempre, sinto sono e um certo fascínio infantil pelas peculiaridades do seu corpo na penumbra.
Você parece feliz, e isso me deixa feliz, muito embora o significado de deitar no seu braço e te abraçar no escuro tenha se perdido horas atrás, em meio a sapatos jogados no chão, folhas debaixo da cama e toques de celular.
Você se levanta e se veste pra ir pra onde quer que você vá e me surpreendo com o fato de que quero que você fique.
Te peço pra ficar e me lembro de que não quero que você fique, quero ficar só, quero ser só, quero estar e permanecer só.
Beijo a sua boca com toda a intensidade, toda a honestidade daquele vínculo que fica quando duas pessoas sabem dos detalhes da nudez uma da outra, sabendo que esse efeito dura um dia ou dois, depois passa, fica embotado e vazio.
Você vai embora, me manda mensagens que leio e releio, e rememoro o calor da tua pele.
Mas aí o efeito vai passando,
passando,
passando,
até passar.
Queria que fosse tudo muito simples.
Amor e etc.
Mas não é,
então eu me deito no sofá e espero até o próximo erro,
até conseguir um mínimo de clareza e entendimento da vida e das nuances de querer estar junto.
Espero.
Sem esperança de encontrar, é claro.
33x06 Different shades of love
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Rodrigo Alarcon
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