Imagem: TingTing Huang
Olho pra mim mesma, de cima pra baixo, de baixo pra cima.
Eu sou, eu era, a mãe da mulher tornou a mulher um monstro direto dos pesadelos da infância, uma sombra escura sobre o leito, fala lenta, amena, monótona. Fórmulas e fatos e questionamentos mornos.
Eu me sento como ele se sentava, eu toco como ele me tocava.
Olho como ele me olhava, falo como ele falava, eu bato à porta como ele batia e entro na vida, valsando, e eu finjo que não quero me meter, eu
Atenta aos detalhes da história, eu inclino a cabeça como ele fazia, mesmo sem querer.
Longas voltas pelo hospital, eu me inclino, mas nem tanto.
Eu me lembro da raiva, do nojo, do receio e me pergunto se eu também causo isso.
Alguém se irrita e grita, e eu me pergunto se estou fazendo a coisa certa, se isso é certo e se eu sou o que ele me fez ser.
O monstro de Frankenstein, sem nome, só partes de remédios, uma colagem de antidepressivos e estabilizadores e antipsicóticos, um pouco disso e daquilo, ciência louca e errática, sem nexo, que apaga pessoas e memórias, anos, organiza pensamentos enquanto destrói poesia e a melancolia e cria uma coisa nova, funcional
perfeitamente funcional
socialmente aceitável
Fico me perguntando se sou, também, uma silenciadora de gritos, uma destruidora de silêncios e experiências individuais, se só eu e não Morfeu é quem tem o poder de adormecer,
se eu tiro o sofrimento ou crio novos.
Não sei se tenho a resposta.
Não sei se quero ter.
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