Imagem: jspad
Uma memória saiu da torre noite passada, fugiu de seu claustro pra me invadir um sonho cômico sobre motocicletas.
Abri os portões de um cômodo - buscava algo, uma caixa - e fui entrar num banheiro branco limpíssimo, cegante. As luzes fluorescentes baixas reffletiam no metal prateado das torneiras e reservados.
O cômodo cheirava (?) a pinho sol, menta e - funguei de novo, pra ter certeza - limão. "Cheira como uma garota tímida que fica nua em público pela primeira vez, Bels, é poético"
(Foi no fim de setembro. Aprendi muito naquele mês. Nasci de novo.)
Uma ponta de colher enegrecida escapa do reservado para deficientes - o maior -, denunciando algo errado. Lá dentro, um menino, pingando suor, se recosta na parede, enquanto uma menina, sentada na tampa do vaso sanitário o observa, concentrada.
Ele é o ídolo dela, seu melhor amigo. Ele sabe tudo o que há para saber sobre ela. E ela sane quase tudo sobre ele. Essa é a última etapa.
Ela observa a mágica, a garota é dissolvida, pronta pra invadir. Ela observa os instrumentos do alquimista, o bico de bunsen roubado, algodões e coisas cujo nome ela desconhece.
Ninguém fala. A mágica parece tomar conta deles. A qualquer momento, um druida pode irromper no reservado e dizer as palávras mágicas, ela pensa.
O cheiro invade suas narinas virgens e ela pensa em napalm, espirra.
Ele sorri "Quase".
Lá fora, a noite parece mais escura do que de costume, tudo parece mais intenso e ela sente medo, sente que aquele momento é um marco - e ela tem razão. Os outros acontecimentos talvez derivem desta noite.
Ele termina e enche a seringa com o líquido cor de urina.
Amarra o próprio torniquete usando a mão e a bocam no braço direito - é canhoto, sinistro; talvez as constantes surras de vara dos avós maternos tivessem nos trazido até esse dia também - já avariado.
Ele sorri pra mim (de mim?), me acalmando.
- Me leve pra casa, querida - as palavras mágicas.
Seu corpo relaxa aos poucos e ele se deixa semi adormecer , escorregar.
Vai pra casa, pra onde eu irei um dia também, ou talvez não.
(Os sonhos que encerram memórias, eles aconteceram? E as memórias que encerram sonhos? Quem é que sabe?)
13x20 O gato de Schrödinger
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