Imagem: TingTing Huang
Ela nem sequer conseguia dizer a palavra.
Olhava pra mim com aqueles olhões enormes, azuis.
E dizia "o que ele fez comigo", "fez aquilo", "forçou aquilo", "a mesma coisa da outra vez", "aconteceu de novo".
E o tempo todo, no meu ouvido, uma voz ríspida gritando que eu a corrigisse.
Eu, impassível, calada, ouvindo e ouvindo.
Aquilo o quê?
O que foi que ele fez com você?
E ela circulava, evitava a palavra como se o nome da coisa carregasse consigo o poder de trazer tudo de volta, como se dizer a palavra fosse
Como se a palavra fosse a lembrança, como se a palavra fosse o homem no escuro, o peso do corpo e o cheiro
Como se 7 letras a tivessem segurado de encontro ao chão.
Como se 7 letras carregassem a culpa de tudo o que houve, e não eles.
7 letras e ela. E o nome dela.
Todo o peso do mundo nas costas de uma pessoa tão pequena, de uma palavra tão pequena e tão apavorante, terrível, grotesca,
e só eu ali, tão pequena e crua e imatura,
quem sou eu pra tirar o peso das costas de Atlas?
Eu sou Ninguém. Ou, talvez,
Ninguém seja quem eu quero ser.
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