Imagem: TingTing Huang
Dentes, flor do cerrado - o rei foi falando cada vez mais perto do meu rosto, perto demais.
Dessa vez, não dei dois passos pra trás.
Era eu e não era eu; Bêbada e sóbria.
A boca dele tocou a minha e eu sabia o que fazer, como se fosse uma lembrança de um aprendizado antigo, tão antigo que eu nem me lembrava mais que havia aprendido um dia.
Ele me tocou e eu soube, em algum lugar da minha mente, que se supunha que aquilo fosse bom.
"Não pare", algo comandou.
Então, continuei acessando cada memória, descobrindo a boca, a língua, mandíbulas, pescoço, costelas, escápulas, úmero. E ele me mostrou dentes e lábios, tão diferente, tão igual.
"Não pare", de novo a voz.
Eu já estava sóbria demais, mas meu meu corpo não era meu, eu era vontade, tempestade e ímpeto, dores de amor que eu não podia gritar ao mundo, era a lembrança da sua respiração na minha boca e do meu corpo na penumbra, algo incontrolável, fome profunda e antiga.
Mordi o lábio dele, como quem sussurra "eu também vi sua fome, eu a vejo nos seus olhos, eu a sinto no seu hálito. Mostre-me", e ele me mostrou.
Tempestade e ímpeto, ele me empurrou, sem soltar a boca da minha, de encontro ao muro. Dessa vez, o muro não era meu. Ele estava faminto de sangue e ossos, como eu estava.
E sugamos a vida um do outro, trocamos força, como se a dor fosse ficar suportável, rei e autômato lutaram feito loucos enquanto o mundo ao redor assistia, embasbacado.
- Quer mais? - ele sussurrou, sorrindo, daquele jeito que ele sorri.
Eu sóbria, queria casa, doramas, quadrinhos.
"Não pare".
Mas minha boca encontrou a dele, de novo e de novo.
E a vida seguiu seu curso.
27x06 Bleach
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Vomitei as tripas no chão, colchão, blusa, vaso sanitário.
Estou me limpando de você.
Limpando minha mente, meu corpo.
Deito no chão, ébria, lenta, solta, boba: invencível.
Posso te amar ou não, de acordo com minha vontade, posso dizer qualquer coisa. Posso ver as cores cada vez mais nítidas, posso sentir meu coração pulsar. Eu danço. E o gosto do sal não me corta a boca, a luz da lua me acaricia e você encolhe até sumir.
No outro dia, vomito as tripas: no chão, colchão, blusa, vaso sanitário.
E digo a mim mesma que estou me limpando de você.
Mente e corpo.
Levanto, bebo água, vomito, durmo.
E, quando a noite chega, me visto de novo, pronta pra mais.
Estou me limpando de você.
Vomitei as tripas no chão, colchão, blusa, vaso sanitário.
Estou me limpando de você.
Limpando minha mente, meu corpo.
Deito no chão, ébria, lenta, solta, boba: invencível.
Posso te amar ou não, de acordo com minha vontade, posso dizer qualquer coisa. Posso ver as cores cada vez mais nítidas, posso sentir meu coração pulsar. Eu danço. E o gosto do sal não me corta a boca, a luz da lua me acaricia e você encolhe até sumir.
No outro dia, vomito as tripas: no chão, colchão, blusa, vaso sanitário.
E digo a mim mesma que estou me limpando de você.
Mente e corpo.
Levanto, bebo água, vomito, durmo.
E, quando a noite chega, me visto de novo, pronta pra mais.
Estou me limpando de você.
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27x05 Traveller
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Imagem: TingTing Huang
Caro David,
estou de volta.
Queria que você fosse o primeiro a saber.
Voltei a beber, hadcore fuckin'. Voltei a sentir aquela fome de sangue e dor, aquela vontade de sair por aí destruindo tudo em que acredito.
Ainda resisto, ou meu corpo resiste à velha B. Luta contra quem eu sou, mesmo agora, mesmo vulnerável.
Digo a mim mesma, antes de dormir, que sou isso. Que desejo isso, que toda a dor vai desaparecer quando eu começar a aceitar quem sou.
Bebo até abaixar minhas reservas, até alcançar a desinibição que me possibilita sair. Bebo e meu corpo vomita, grita e luta, me amordaça.
Mas eu sou quem sou.
E fiquei muito tempo presa, à espreita, pra simplesmente me deixar vencer.
Quero sangue, carne, ossos, saliva. Eu quero sugar das pessoas a força vital necessária pra ficar aqui.
Quero ficar forte o suficiente pra que números desenhados na pele não possam me conter, pra não sentir culpa, nem dor.
David, as coisas estão diferentes. Estão voltando a ser como deveriam. Volte. Volte, também.
Mas não tenha pressa:
estou aqui pra ficar.
Com amor,
B.
Caro David,
estou de volta.
Queria que você fosse o primeiro a saber.
Voltei a beber, hadcore fuckin'. Voltei a sentir aquela fome de sangue e dor, aquela vontade de sair por aí destruindo tudo em que acredito.
Ainda resisto, ou meu corpo resiste à velha B. Luta contra quem eu sou, mesmo agora, mesmo vulnerável.
Digo a mim mesma, antes de dormir, que sou isso. Que desejo isso, que toda a dor vai desaparecer quando eu começar a aceitar quem sou.
Bebo até abaixar minhas reservas, até alcançar a desinibição que me possibilita sair. Bebo e meu corpo vomita, grita e luta, me amordaça.
Mas eu sou quem sou.
E fiquei muito tempo presa, à espreita, pra simplesmente me deixar vencer.
Quero sangue, carne, ossos, saliva. Eu quero sugar das pessoas a força vital necessária pra ficar aqui.
Quero ficar forte o suficiente pra que números desenhados na pele não possam me conter, pra não sentir culpa, nem dor.
David, as coisas estão diferentes. Estão voltando a ser como deveriam. Volte. Volte, também.
Mas não tenha pressa:
estou aqui pra ficar.
Com amor,
B.
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27x04 Werther
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Imagem: TingTing Huang
Quando Werther morreu,
dormi.
Sonhei com você, um sonho ruim, que esqueci, mas que me deixou uma sensação de inquietude que eu não conseguia deixar de lado.
Werther morreu e eu não queria morrer de novo. Pelo contrário: eu queria viver.
Fiquei olhando pro teto, deitada no mesmo lugar em que me deitei quando você me deixou pela segunda vez.
E, desde então, você vem me deixando, de novo e de novo, sem nem saber que eu tenho mantido o nós vivo, oculto, tenho insuflado ar em seus pulmões diariamente, mantendo-o vivo enquanto eu morro aos poucos.
Mas Werther morreu e eu percebi que não quero mais morrer.
Percebi que não posso mais fazer isso, que essa dor não é mais necessária.
Desenrolei meus cabelos como se me preparasse para um ritual há muito adiado e me vesti - de preto, é claro -, ainda com aquela sensação ruim, aquele luto antigo a sair de mim, a escorrer pelos dedos.
Passei maquiagem, me vesti sob o olhar acusador de nós, débil, pálido.
Beijei-o nos lábios, deixando machas de batom cor de rosa.
Apaguei as luzes, desliguei as máquinas, saí de casa.
Adeus.
No fundo, você sabe, esperava que ele lutasse, que fosse mais forte que isso.
Mas era imperativo viver.
Werther estava morto, e é assim que é.
Quando Werther morreu,
dormi.
Sonhei com você, um sonho ruim, que esqueci, mas que me deixou uma sensação de inquietude que eu não conseguia deixar de lado.
Werther morreu e eu não queria morrer de novo. Pelo contrário: eu queria viver.
Fiquei olhando pro teto, deitada no mesmo lugar em que me deitei quando você me deixou pela segunda vez.
E, desde então, você vem me deixando, de novo e de novo, sem nem saber que eu tenho mantido o nós vivo, oculto, tenho insuflado ar em seus pulmões diariamente, mantendo-o vivo enquanto eu morro aos poucos.
Mas Werther morreu e eu percebi que não quero mais morrer.
Percebi que não posso mais fazer isso, que essa dor não é mais necessária.
Desenrolei meus cabelos como se me preparasse para um ritual há muito adiado e me vesti - de preto, é claro -, ainda com aquela sensação ruim, aquele luto antigo a sair de mim, a escorrer pelos dedos.
Passei maquiagem, me vesti sob o olhar acusador de nós, débil, pálido.
Beijei-o nos lábios, deixando machas de batom cor de rosa.
Apaguei as luzes, desliguei as máquinas, saí de casa.
Adeus.
No fundo, você sabe, esperava que ele lutasse, que fosse mais forte que isso.
Mas era imperativo viver.
Werther estava morto, e é assim que é.
27x03 Austenland
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garota solteira procura,
Ele diz que gosta de mim, e dou um aviso: Eu não gosto.
Ele diz que vai insistir, que podemos ter algo bom.
Respondo com cinismo, dou dois passos pra trás.
Chama pra ir ao cinema e eu digo não.
Não. Não. Não. Não.
Bebo.
Digo sim.
E depois não.
Tento assustá-lo, não falo, me afasto.
"Você está tentando assustar uma pessoa que não se assusta assim facilmente. Vai te dar um trabalhinho me assustar. Mas eu gosto quando você tenta".
Continuo tentando, ferozmente, mas confesso:
às vezes, tenho vontade de parar de tentar e ver no que é que dá.
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Mumford & sons,
um cara que fazia dragões
27x02 Gasolina
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Fui pra casa, casa de nós dois, penumbra, telefones tocando, livros, tantas palavras e vozes, o ar denso e pesado, uma réplica de tudo e de nada.
Sinto dor. O tempo todo, uma dor que as características semiológicas não abarcam, em peso, pontada, queimação. Irradiada, referida.
Uma dor chata que não some, não vai embora com painkillers, álcool, drogas drogas drogas. Nem com seriados, livros, ou quando me divirto.
Deito na cama, na sua cama de agosto ou na sua cama de quando nos encontramos nas férias. Na minha cama depois do baile de inverno, em um colchão no chão. E olho pra mancha no seu teto, pras sombras que suas cortinas fazem.
Eu não quero ter paciência. Eu não quero esperar até que você me magoe mais. E eu não quero me habituar a essa dor.
Jogo gasolina em tudo.
Cuckoo's calling,
Edições diferentes de Harry Potter,
Mike,
Júlio Verne,
Sandman,
John Green,
Big bang,
a mesinha de madeira,
o tapete,
o sofá marrom,
Neil Gaiman,
Saramago,
Darth Vader,
Tardis,
encharco tudo, sem pensar,
tênis vermelhos,
lápis,
fios,
a TV,
mesa e cadeiras,
o banheiro,
sabonete líquido de morango,
camisetas,
cortinas,
calças pretas,
gato e galinha,
Marilyn e JFK,
Daniel Handler,
Moira Young,
Rick Riordan,
Audrey Niffenegger,
Chbosky,
tudo fica molhado, eu estou molhada e pretendo ficar mais.
O cheiro já não me incomoda, minha pele queima e eu nem acendi o fósforo.
A gasolina me devora a carne, mas eu mal sinto, eu não sinto.
Penso em acender o fósforo, jogá-lo em qualquer canto e sentir o fogo chegar até mim antes que eu pisque.
Até abro a caixa, pego o fósforo, mas desisto, guardo.
Quero que você o faça.
Tiro os sapatos no lugar de sempre, sento no sofá, no canto esquerdo, e fico te esperando chegar.
Eu não vou estragar tudo, dessa vez. Você vai.
Espero. Uma hora dessas você chega, cansado ou não, e explode a coisa toda.
Não vou precisar esperar muito.
Fui pra casa, casa de nós dois, penumbra, telefones tocando, livros, tantas palavras e vozes, o ar denso e pesado, uma réplica de tudo e de nada.
Sinto dor. O tempo todo, uma dor que as características semiológicas não abarcam, em peso, pontada, queimação. Irradiada, referida.
Uma dor chata que não some, não vai embora com painkillers, álcool, drogas drogas drogas. Nem com seriados, livros, ou quando me divirto.
Deito na cama, na sua cama de agosto ou na sua cama de quando nos encontramos nas férias. Na minha cama depois do baile de inverno, em um colchão no chão. E olho pra mancha no seu teto, pras sombras que suas cortinas fazem.
Eu não quero ter paciência. Eu não quero esperar até que você me magoe mais. E eu não quero me habituar a essa dor.
Jogo gasolina em tudo.
Cuckoo's calling,
Edições diferentes de Harry Potter,
Mike,
Júlio Verne,
Sandman,
John Green,
Big bang,
a mesinha de madeira,
o tapete,
o sofá marrom,
Neil Gaiman,
Saramago,
Darth Vader,
Tardis,
encharco tudo, sem pensar,
tênis vermelhos,
lápis,
fios,
a TV,
mesa e cadeiras,
o banheiro,
sabonete líquido de morango,
camisetas,
cortinas,
calças pretas,
gato e galinha,
Marilyn e JFK,
Daniel Handler,
Moira Young,
Rick Riordan,
Audrey Niffenegger,
Chbosky,
tudo fica molhado, eu estou molhada e pretendo ficar mais.
O cheiro já não me incomoda, minha pele queima e eu nem acendi o fósforo.
A gasolina me devora a carne, mas eu mal sinto, eu não sinto.
Penso em acender o fósforo, jogá-lo em qualquer canto e sentir o fogo chegar até mim antes que eu pisque.
Até abro a caixa, pego o fósforo, mas desisto, guardo.
Quero que você o faça.
Tiro os sapatos no lugar de sempre, sento no sofá, no canto esquerdo, e fico te esperando chegar.
Eu não vou estragar tudo, dessa vez. Você vai.
Espero. Uma hora dessas você chega, cansado ou não, e explode a coisa toda.
Não vou precisar esperar muito.
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delayed,
Mais do mesmo,
Now that's what I call fossa,
Pégaso,
The Weeknd
Early Cuts: Forgetfulness
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
- Eu quero esquecer de tudo, - peço à lua azul - mas não sei como.
Me preparo pra mais uma noite longa de dor, preparo distrações, anestesia.
Chego em casa. Suja, vazia, cheia, cabeça zunindo, sem sono, sem vontade.
Resolvo sair. Fico bêbada, música, penumbra, lua, fumaça.
Esquecer é como desligar o interruptor, impedir a passagem do impulso.
- Você quer?
E, mesmo antes que eu possa raciocinar, um lábio encosta no outro, um só de cada, e me queima por dentro, feito ácido.
Fico com medo, mas passa rápido. Quero falar com ele, mas passa rápido, feito uma luz que pisca.
Nada.
Tenho acesso repentino a qualquer lembrança, mas nenhuma importa.
Nada.
Sou só eu, aqui, agora.
Meu celular pisca. Uma, duas. três vezes.
"B, vamos sair?"
Assim só, sem grandes discursos, sem histórias, sem rodeios.
Lua, fumaça, os gênios, amor, aventura, eu e a penumbra.
Soletro:
Q-U-A-N-D-O ?
Aperto enviar.
There's no need to complicate.
- Eu quero esquecer de tudo, - peço à lua azul - mas não sei como.
Me preparo pra mais uma noite longa de dor, preparo distrações, anestesia.
Chego em casa. Suja, vazia, cheia, cabeça zunindo, sem sono, sem vontade.
Resolvo sair. Fico bêbada, música, penumbra, lua, fumaça.
Esquecer é como desligar o interruptor, impedir a passagem do impulso.
- Você quer?
E, mesmo antes que eu possa raciocinar, um lábio encosta no outro, um só de cada, e me queima por dentro, feito ácido.
Fico com medo, mas passa rápido. Quero falar com ele, mas passa rápido, feito uma luz que pisca.
Nada.
Tenho acesso repentino a qualquer lembrança, mas nenhuma importa.
Nada.
Sou só eu, aqui, agora.
Meu celular pisca. Uma, duas. três vezes.
"B, vamos sair?"
Assim só, sem grandes discursos, sem histórias, sem rodeios.
Lua, fumaça, os gênios, amor, aventura, eu e a penumbra.
Soletro:
Q-U-A-N-D-O ?
Aperto enviar.
There's no need to complicate.
Early Cuts: Neon Lights
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
James me levou pra dançar, me tirou de casa, da dor de ficar sabendo que acabamos.
Na noite escura, eu já tinha rasgado minha pele e queimado minhas mãos com o ácido que jorrava das minhas veias.
Eu estava com raiva, mas não era raiva. Era dor, mas eu não sabia como expressar. Não sei mais uivar, não queria falar.
Eu só queria silêncio, ficar debaixo das cobertas, não ver mais nada que significasse "nós".
Graças a Deus, James, camisas brancas, liguei o carro e fomos pra longe de tudo, pro centro de tudo, socar e cuspir - James foi enfrentar as próprias lembranças e eu fui fugir das minhas.
Dancei. 5 horas seguidas, até não conseguir mais andar. Eu dancei cada música, no meio de tantos estranhos. Dancei pra mim mesma, sem querer que ninguém me olhasse, sem querer parar.
Dancei pra não gritar, concentrei toda a minha fúria, músculos e ossos, vias neurais em chamas, o corpo todo gritando o seu nome, te mandando embora.
Eu gritei no escuro, no meio da fumaça, gritei tudo e nada porque eu não tinha nada pra te dizer.
E tinha tudo o que eu não disse, tudo o que escrevi em pequenas folhas coloridas, tudo o que nunca vou dizer porque nada vai mudar. Ou porque, talvez, tudo mude.
Então dancei minhas palavras não ditas, dancei minha nudez, nossa nudez, dancei toda a dor surda até que se tornasse física, até não conseguir ouvir, até não conseguir andar.
E, no final, quando eu já me sentia limpa, livre de toda a fúria, ele apareceu.
Mas já era tarde. Toda a fúria a ser convertida em algo já tinha se esvaído. Agora só tinha medo, que ele confundiu com timidez.
Era medo de toque, medo de ser rejeitada de novo, medo de superar, medo de gostar de alguém, medo de gente, de escuro, da proximidade da boca dele do meu ouvido, de qualquer proximidade.
Dei dois passos pra trás, mas teria dado dez, se houvesse espaço.
Eu deixei toda a raiva ali, fui pra casa mancando.
E é por isso que não sinto mais raiva.
Só sinto medo.
James me levou pra dançar, me tirou de casa, da dor de ficar sabendo que acabamos.
Na noite escura, eu já tinha rasgado minha pele e queimado minhas mãos com o ácido que jorrava das minhas veias.
Eu estava com raiva, mas não era raiva. Era dor, mas eu não sabia como expressar. Não sei mais uivar, não queria falar.
Eu só queria silêncio, ficar debaixo das cobertas, não ver mais nada que significasse "nós".
Graças a Deus, James, camisas brancas, liguei o carro e fomos pra longe de tudo, pro centro de tudo, socar e cuspir - James foi enfrentar as próprias lembranças e eu fui fugir das minhas.
Dancei. 5 horas seguidas, até não conseguir mais andar. Eu dancei cada música, no meio de tantos estranhos. Dancei pra mim mesma, sem querer que ninguém me olhasse, sem querer parar.
Dancei pra não gritar, concentrei toda a minha fúria, músculos e ossos, vias neurais em chamas, o corpo todo gritando o seu nome, te mandando embora.
Eu gritei no escuro, no meio da fumaça, gritei tudo e nada porque eu não tinha nada pra te dizer.
E tinha tudo o que eu não disse, tudo o que escrevi em pequenas folhas coloridas, tudo o que nunca vou dizer porque nada vai mudar. Ou porque, talvez, tudo mude.
Então dancei minhas palavras não ditas, dancei minha nudez, nossa nudez, dancei toda a dor surda até que se tornasse física, até não conseguir ouvir, até não conseguir andar.
E, no final, quando eu já me sentia limpa, livre de toda a fúria, ele apareceu.
Mas já era tarde. Toda a fúria a ser convertida em algo já tinha se esvaído. Agora só tinha medo, que ele confundiu com timidez.
Era medo de toque, medo de ser rejeitada de novo, medo de superar, medo de gostar de alguém, medo de gente, de escuro, da proximidade da boca dele do meu ouvido, de qualquer proximidade.
Dei dois passos pra trás, mas teria dado dez, se houvesse espaço.
Eu deixei toda a raiva ali, fui pra casa mancando.
E é por isso que não sinto mais raiva.
Só sinto medo.
27x01 Alodinia
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Manhã de sábado, bêbada de sono e vodka, meu telefone toca. Alex. Não atendo, volto pro meu sono de sonhos vívidos e tolos, mas o telefone toca e desperta e eu sei que não posso ficar o resto da vida nessa cama.
Tomo banho, corro pro Balaio, ressaca me furando a cabeça, Alex sentado na minha mesa, na mesa do nosso primeiro dia dos namorados, como se soubesse que me magoaria. E eu não duvido que saiba.
- O que você quer? despejo, á grisa de cumprimento. Ele me olha, por trás dos óculos escuros. Me pergunto se ele também está vendo o que vejo por trás dos meus, o mundo em chamas.
- Eu queria te ver.
Parece simples, mas nada é simples entre nós, por isso me sento e observo enquanto ele toma seu café com nome de mulher.
Sei que ele não me chamou pelo prazer da minha companhia. Ele quer me ver sangrar, sempre, então me preparo em silêncio, pra receber o primeiro golpe.
Não demora.
- Soube que seu namorado terminou com você.
- Hm.
- Isso explica o seu estado. Você parece lixo.
Não é mentira. Meus cabelos revoltos se emaranham e se contorcem, embaraçados, impenteáveis. Minhas roupas estão folgadas, andei doente, perdi peso. Não tenho dormido, olheiras enormes dominam meu rosto.
E eu me sinto um lixo.
- Eu fiquei me perguntando... O que houve: O que você fez dessa vez? Fodeu com a cabeça dele, claro, como você sempre faz. Deve ter feito tudo direitinho, planejado cada palavra, só pra depois agir do jeito de sempre e foder com tudo.
Não me aguento. Cansei de ficar me culpando. A merda de um relacionamento tem duas pessoas. Eu não vou carregar isso sozinha, obrigada, nem mesmo pra não discutir com um idiota como o Alex.
- Eu fodi tudo?? Eu fiz o que eu sabia fazer. Eu fiz até melhor do que esperavam de mim, o que é bem mais do que você já fez na sua...
- Você é uma filha da puta cínica, sabia? - ele me interrompe - Tem coragem de sair por aí agindo como se estivesse sofrendo, como se tivesse dado o seu melhor, quando nós dois sabemos que você não é capaz de amar ninguém. Você é tão fodida que não consegue fazer isso. Só sabe ferrar com as pessoas. Com todo mundo que já sentiu qualquer coisa por você. E essa porra de fingir que está sofrendo pra escrever em algum caderno o quanto sua vida é infeliz. Você nem se importa. Você só faz isso porque se sente uma bosta. Não porque você gosta de alguém, porque fez as coisas. Você se sente uma bosta porque não consegue fazer isso. Nunca vai conseguir. Você é fodida. Só se aproxima das pessoas pra machucá-las.
Ele acende um cigarro, as mãos tremendo de raiva, o rosto manchado de vermelho, a mesma raiva de sempre que o faz desviar os olhos, querer me bater e me machucar, sabendo que não pode, ou que não consegue.
Pego um cigarro, acendo. Trago uma, duas vezes.
Odeio fumar, mas não importa. É um statement. Adequado.
Olho meus nós dos dedos, a rua vazia, os óculos de sol de Alex.
- Você está certo.
Ele olha pra mim, sem dizer nada.
Continuo:
- Eu nunca amei ninguém. Nunca vou. Não sou capaz. Isso que estou sentindo agora, essa dor, essa falta de qualquer coisa... É culpa. Vai passar logo.
Trago o cigarro, tenho um breve acesso de tosse tosco - falta de costume -, e ele me observa inexpressivo.
(Talvez ele tenha vindo aqui pra isso, pra me lembrar: Eu não sou capaz. A parte mais triste disso tudo é que ele não se importa. Isso não muda a forma como se sente. Um dia, eu vou criar coragem pra machucá-lo de novo, e vou dizer a ele a verdade, que isso que ele sente não é o que ele pensa que é. Que ele também têm arrastado um cavalo morto por aí, como eu tenho feito, e que seria tão melhor se ele enterrasse seus mortos.
Mas não é a hora ainda. Alex deixaria de ser Alex sem o gosto do meu sangue na boca. E, nesses tempos difíceis, não se pode dar ao luxo de ser feliz.)
Recuperada, me levanto e beijo o topo da sua cabeça.
- Obrigada por me lembrar. - sussurro.
Volto pra casa e deito na cama, sem vodka, sem nada, sentindo a dor até me convencer de que é só culpa.
Não pode ser outra coisa.
Eu não sou capaz de outra coisa.
Manhã de sábado, bêbada de sono e vodka, meu telefone toca. Alex. Não atendo, volto pro meu sono de sonhos vívidos e tolos, mas o telefone toca e desperta e eu sei que não posso ficar o resto da vida nessa cama.
Tomo banho, corro pro Balaio, ressaca me furando a cabeça, Alex sentado na minha mesa, na mesa do nosso primeiro dia dos namorados, como se soubesse que me magoaria. E eu não duvido que saiba.
- O que você quer? despejo, á grisa de cumprimento. Ele me olha, por trás dos óculos escuros. Me pergunto se ele também está vendo o que vejo por trás dos meus, o mundo em chamas.
- Eu queria te ver.
Parece simples, mas nada é simples entre nós, por isso me sento e observo enquanto ele toma seu café com nome de mulher.
Sei que ele não me chamou pelo prazer da minha companhia. Ele quer me ver sangrar, sempre, então me preparo em silêncio, pra receber o primeiro golpe.
Não demora.
- Soube que seu namorado terminou com você.
- Hm.
- Isso explica o seu estado. Você parece lixo.
Não é mentira. Meus cabelos revoltos se emaranham e se contorcem, embaraçados, impenteáveis. Minhas roupas estão folgadas, andei doente, perdi peso. Não tenho dormido, olheiras enormes dominam meu rosto.
E eu me sinto um lixo.
- Eu fiquei me perguntando... O que houve: O que você fez dessa vez? Fodeu com a cabeça dele, claro, como você sempre faz. Deve ter feito tudo direitinho, planejado cada palavra, só pra depois agir do jeito de sempre e foder com tudo.
Não me aguento. Cansei de ficar me culpando. A merda de um relacionamento tem duas pessoas. Eu não vou carregar isso sozinha, obrigada, nem mesmo pra não discutir com um idiota como o Alex.
- Eu fodi tudo?? Eu fiz o que eu sabia fazer. Eu fiz até melhor do que esperavam de mim, o que é bem mais do que você já fez na sua...
- Você é uma filha da puta cínica, sabia? - ele me interrompe - Tem coragem de sair por aí agindo como se estivesse sofrendo, como se tivesse dado o seu melhor, quando nós dois sabemos que você não é capaz de amar ninguém. Você é tão fodida que não consegue fazer isso. Só sabe ferrar com as pessoas. Com todo mundo que já sentiu qualquer coisa por você. E essa porra de fingir que está sofrendo pra escrever em algum caderno o quanto sua vida é infeliz. Você nem se importa. Você só faz isso porque se sente uma bosta. Não porque você gosta de alguém, porque fez as coisas. Você se sente uma bosta porque não consegue fazer isso. Nunca vai conseguir. Você é fodida. Só se aproxima das pessoas pra machucá-las.
Ele acende um cigarro, as mãos tremendo de raiva, o rosto manchado de vermelho, a mesma raiva de sempre que o faz desviar os olhos, querer me bater e me machucar, sabendo que não pode, ou que não consegue.
Pego um cigarro, acendo. Trago uma, duas vezes.
Odeio fumar, mas não importa. É um statement. Adequado.
Olho meus nós dos dedos, a rua vazia, os óculos de sol de Alex.
- Você está certo.
Ele olha pra mim, sem dizer nada.
Continuo:
- Eu nunca amei ninguém. Nunca vou. Não sou capaz. Isso que estou sentindo agora, essa dor, essa falta de qualquer coisa... É culpa. Vai passar logo.
Trago o cigarro, tenho um breve acesso de tosse tosco - falta de costume -, e ele me observa inexpressivo.
(Talvez ele tenha vindo aqui pra isso, pra me lembrar: Eu não sou capaz. A parte mais triste disso tudo é que ele não se importa. Isso não muda a forma como se sente. Um dia, eu vou criar coragem pra machucá-lo de novo, e vou dizer a ele a verdade, que isso que ele sente não é o que ele pensa que é. Que ele também têm arrastado um cavalo morto por aí, como eu tenho feito, e que seria tão melhor se ele enterrasse seus mortos.
Mas não é a hora ainda. Alex deixaria de ser Alex sem o gosto do meu sangue na boca. E, nesses tempos difíceis, não se pode dar ao luxo de ser feliz.)
Recuperada, me levanto e beijo o topo da sua cabeça.
- Obrigada por me lembrar. - sussurro.
Volto pra casa e deito na cama, sem vodka, sem nada, sentindo a dor até me convencer de que é só culpa.
Não pode ser outra coisa.
Eu não sou capaz de outra coisa.
26x17 No love lost (Season Finale)
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Cara Ulrika,
você estava errada.
Você disse que ninguém nunca iria ser capaz de nos amar como somos, você me disse e eu acreditei por anos.
Você estava errada.
Eu fui amada.
Várias vezes, de várias maneiras.
Eu vi como era, Ulrika. Sem mentiras. Era eu, era quem eu sou, quem eu era, toda aquela nojeira e cada segredo sendo descoberto devagar, todo o horror de quem eu sou. E eu entendi, Ulri. Entendi o que você tentou fazer.
Entendi que você não estava errada. Você estava mentindo.
Não estava tentando me ferir com a verdade, como eu pensava: estava tentando me proteger.
O problema nunca esteve nas pessoas, Ulrika, e você sempre soube; nas pessoas que nunca conseguiriam entender nossa complexidade, nossa monstruosidade, e nos amar apesar disso, por causa disso.
O problema era eu, não era?
Por isso você disse aquilo. Porque eu é quem nunca ia deixar que alguém me amasse, nunca iria entender, nunca iria conseguir.
Você sabia, esse tempo todo, em que eu andei te afastando, afastando o mundo inteiro, ocupada construindo um muro que impedisse qualquer um de entrar. Impedindo que você entrasse.
Eu queria dizer que quero que ninguém nunca mais tente entrar. Que ser amada dói muito, porque eu não sei, eu não quero saber como fazer. Eu não quero mais tentar.
Queria dizer que não quero mais amar ninguém.
E que não quero mais ficar próxima de ninguém.
Eu quero dizer tudo isso, quero que seja verdade.
Mas já tem mentiras demais entre nós,
não?
Com amor,
B.
Cara Ulrika,
você estava errada.
Você disse que ninguém nunca iria ser capaz de nos amar como somos, você me disse e eu acreditei por anos.
Você estava errada.
Eu fui amada.
Várias vezes, de várias maneiras.
Eu vi como era, Ulrika. Sem mentiras. Era eu, era quem eu sou, quem eu era, toda aquela nojeira e cada segredo sendo descoberto devagar, todo o horror de quem eu sou. E eu entendi, Ulri. Entendi o que você tentou fazer.
Entendi que você não estava errada. Você estava mentindo.
Não estava tentando me ferir com a verdade, como eu pensava: estava tentando me proteger.
O problema nunca esteve nas pessoas, Ulrika, e você sempre soube; nas pessoas que nunca conseguiriam entender nossa complexidade, nossa monstruosidade, e nos amar apesar disso, por causa disso.
O problema era eu, não era?
Por isso você disse aquilo. Porque eu é quem nunca ia deixar que alguém me amasse, nunca iria entender, nunca iria conseguir.
Você sabia, esse tempo todo, em que eu andei te afastando, afastando o mundo inteiro, ocupada construindo um muro que impedisse qualquer um de entrar. Impedindo que você entrasse.
Eu queria dizer que quero que ninguém nunca mais tente entrar. Que ser amada dói muito, porque eu não sei, eu não quero saber como fazer. Eu não quero mais tentar.
Queria dizer que não quero mais amar ninguém.
E que não quero mais ficar próxima de ninguém.
Eu quero dizer tudo isso, quero que seja verdade.
Mas já tem mentiras demais entre nós,
não?
Com amor,
B.
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Isbells
26x16 Rabo Córneo Húngaro
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Eu não estou pronta.
Ele se aproximou e dei dois passos para trás.
Não quero beijos, nem sei mais manter diálogos.
Sou um bicho doente, assustadiço.
Ele me tocou o cabelo e me enrolei feito lagarta. Tô com medo, não me olhe, não me toque.
Sou bicho que levou uma surra sem apanhar, e as memórias são fortes demais pra que eu me aproxime e coma a comida que você traz nas mãos.
Você se encosta em mim, inofensivo, e eu fico rígida, meu corpo todo responde em alerta, selvagem, posição de fuga.
Eu não quero te machucar. Eu não quero me machucar.
Sou melhor do que isso, mas talvez não seja mais.
Apague as luzes, quando sair.
Quero ficar só.
Eu não estou pronta.
Ele se aproximou e dei dois passos para trás.
Não quero beijos, nem sei mais manter diálogos.
Sou um bicho doente, assustadiço.
Ele me tocou o cabelo e me enrolei feito lagarta. Tô com medo, não me olhe, não me toque.
Sou bicho que levou uma surra sem apanhar, e as memórias são fortes demais pra que eu me aproxime e coma a comida que você traz nas mãos.
Você se encosta em mim, inofensivo, e eu fico rígida, meu corpo todo responde em alerta, selvagem, posição de fuga.
Eu não quero te machucar. Eu não quero me machucar.
Sou melhor do que isso, mas talvez não seja mais.
Apague as luzes, quando sair.
Quero ficar só.
26x15 Membro Fantasma
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Eu quero te arrancar de mim.
Cada pedaço de pele, cada átomo seu que acabou perdido entre os meus. Esfrego a pele até ficar vermelha, arder.
Eu quero te arrancar de mim, quebrar cada osso que se chocou contra os seus, minha coluna que se curva sob o peso do mundo que não era mais só meu. Minha medula que, feito cobra venenosa, espalha pelo meu corpo sinais de um toque que não é real, veneno elétrico, despertando cada canal.
Quero te arrancar de mim. Cada conexão refeita, cada memória, onde quer que esteja armazenada.
Quero te arrancar de mim, mas acho mais fácil me arrancar de mim.
Eu quero te arrancar de mim.
Cada pedaço de pele, cada átomo seu que acabou perdido entre os meus. Esfrego a pele até ficar vermelha, arder.
Eu quero te arrancar de mim, quebrar cada osso que se chocou contra os seus, minha coluna que se curva sob o peso do mundo que não era mais só meu. Minha medula que, feito cobra venenosa, espalha pelo meu corpo sinais de um toque que não é real, veneno elétrico, despertando cada canal.
Quero te arrancar de mim. Cada conexão refeita, cada memória, onde quer que esteja armazenada.
Quero te arrancar de mim, mas acho mais fácil me arrancar de mim.
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Now that's what I call fossa,
Pégaso
26x14 Choice
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Abro a porta, que range, baixinho.
Quarto escuro, típico delas. Não consigo ver, mas esse quarto não é mesmo pra ser visto.
Ouço o ruído do tear, da tesoura. Madeira, metal, tecido.
- Estou aqui - digo.
Ninguém responde. Aos poucos, meus olhos vão se acostumando à pouca luminosidade.
Cada uma delas executa sua parte no trabalho, rapidamente, tecendo e cortando à medida em que o mundo muda, antes que mude. Velozes, as mãos viajam de um lado a outro e meus olhos se perdem.
- Eu preciso saber - digo - Estou aqui porque preciso saber quando isso vai acabar. Por favor.
Nenhuma delas para, nenhuma delas volta o rosto pra mim, de maneira que não sei qual delas pode ver adiante, quem pode me dar a resposta que preciso.
- Está doendo? - pergunta a Mãe.
- Sim.
- O que é a dor? - diz Morta, com sua vozinha infantil e sombria - Não, não venha me falar sobre vias, fibras e receptores. Quero saber da sua dor. O que é?
- Eu não sei o que você quer dizer. Só quero que passe.
- Já te demos a resposta: Paciência.
- Eu não quero esperar, Eu quero isso fora de mim!
- Ok. - responde a donzela, cuja voz raramente ouço.
Ela se levanta e, instintivamente, olho para o tear, que continua o seu trabalho, como se movido por mãos invisíveis.
- Não se preocupe, - ela diz, de costas pra mim - Ele estava aqui antes mesmo que a ideia de mim nascesse. E estará aí quando essa ideia morrer. Ela se virou pra mim, com seu único olho de todas as cores, olhou dentro de mim, viu cada traçado da minha tapeçaria.
- Sua dor não é doença. É um tributo. A antítese do seu arrependimento. Portanto, a escolha é sua. Você vai esquecer, quando quiser.
- Quanto tempo? Quando? - agarro o braço dela, impaciente, nervosa. E ela me olha como se eu não fosse nada.
- O que é o tempo, sua menina tola? O tempo é um detalhe. Você quer tempo, data, hora marcada? Eu te darei tempo. Mas você não terá coragem de usá-lo.
Uma semana.
Se você tiver a coragem necessária pra seguir em frente, pra conseguir o que quer, siga. Se você não tiver, como já não teve antes,
- E eu estava certa! Ele não era pra mim! - grito
- Se você diz, quem sou eu pra discutir?
Ela libera seu braço do meu aperto, antes de se afastar, dizendo
- Tenha uma boa semana.
Passa a mão fria no meu cabelo e volta a se sentar.
Não sinto que está sendo irônica.
Ela me deu o que eu queria.
Agora, eu só preciso fazer a escolha certa.
E eu vou fazer,
Não vou?
(Hoje acaba o prazo. Eu fiz minha escolha. Ou melhor, não fiz escolha nenhuma. Faltam 3 horas e meia para a meia noite, mas eu sei que nada vai mudar. Eu não tenho a coragem necessária pra seguir em frente. Quero o que quero, e quero agora, mesmo que machuque,Eu não sei o que essas três horas trarão, mas já sinto que desperdicei a chance de me apaixonar de novo. E não ligo.
Eu sou como sou.)
Abro a porta, que range, baixinho.
Quarto escuro, típico delas. Não consigo ver, mas esse quarto não é mesmo pra ser visto.
Ouço o ruído do tear, da tesoura. Madeira, metal, tecido.
- Estou aqui - digo.
Ninguém responde. Aos poucos, meus olhos vão se acostumando à pouca luminosidade.
Cada uma delas executa sua parte no trabalho, rapidamente, tecendo e cortando à medida em que o mundo muda, antes que mude. Velozes, as mãos viajam de um lado a outro e meus olhos se perdem.
- Eu preciso saber - digo - Estou aqui porque preciso saber quando isso vai acabar. Por favor.
Nenhuma delas para, nenhuma delas volta o rosto pra mim, de maneira que não sei qual delas pode ver adiante, quem pode me dar a resposta que preciso.
- Está doendo? - pergunta a Mãe.
- Sim.
- O que é a dor? - diz Morta, com sua vozinha infantil e sombria - Não, não venha me falar sobre vias, fibras e receptores. Quero saber da sua dor. O que é?
- Eu não sei o que você quer dizer. Só quero que passe.
- Já te demos a resposta: Paciência.
- Eu não quero esperar, Eu quero isso fora de mim!
- Ok. - responde a donzela, cuja voz raramente ouço.
Ela se levanta e, instintivamente, olho para o tear, que continua o seu trabalho, como se movido por mãos invisíveis.
- Não se preocupe, - ela diz, de costas pra mim - Ele estava aqui antes mesmo que a ideia de mim nascesse. E estará aí quando essa ideia morrer. Ela se virou pra mim, com seu único olho de todas as cores, olhou dentro de mim, viu cada traçado da minha tapeçaria.
- Sua dor não é doença. É um tributo. A antítese do seu arrependimento. Portanto, a escolha é sua. Você vai esquecer, quando quiser.
- Quanto tempo? Quando? - agarro o braço dela, impaciente, nervosa. E ela me olha como se eu não fosse nada.
- O que é o tempo, sua menina tola? O tempo é um detalhe. Você quer tempo, data, hora marcada? Eu te darei tempo. Mas você não terá coragem de usá-lo.
Uma semana.
Se você tiver a coragem necessária pra seguir em frente, pra conseguir o que quer, siga. Se você não tiver, como já não teve antes,
- E eu estava certa! Ele não era pra mim! - grito
- Se você diz, quem sou eu pra discutir?
Ela libera seu braço do meu aperto, antes de se afastar, dizendo
- Tenha uma boa semana.
Passa a mão fria no meu cabelo e volta a se sentar.
Não sinto que está sendo irônica.
Ela me deu o que eu queria.
Agora, eu só preciso fazer a escolha certa.
E eu vou fazer,
Não vou?
(Hoje acaba o prazo. Eu fiz minha escolha. Ou melhor, não fiz escolha nenhuma. Faltam 3 horas e meia para a meia noite, mas eu sei que nada vai mudar. Eu não tenho a coragem necessária pra seguir em frente. Quero o que quero, e quero agora, mesmo que machuque,Eu não sei o que essas três horas trarão, mas já sinto que desperdicei a chance de me apaixonar de novo. E não ligo.
Eu sou como sou.)
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26x13 O Senhor das Moscas
Postado por
garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Um interlúdio. Lembranças antigas. Talvez, as coisas tenham que ser assim.
Dei meu primeiro soco aos 9, enquanto Felipe tomava seu centésimo porre aos 13.
Mijei em telhados, 2 socos fortes no estômago, que me fizeram sentir mais dor do que achei que seria possível. Intensidade máxima, de forma que nada nunca mais se aproximou daquilo, do misto de dor e humilhação, do gosto de terra e lágrimas.
Puxões de cabelo, tarja preta.
Eu desenhava números por todo o corpo, marcas da besta que eu era, pra afastar as pessoas, pra conter o corpo, pra conter o espírito ruim, pra deixar de fora todo o resto: pra proteger o mundo de mim.
Balé, a dor de ficar de pé durante horas tentando acertar uma posição que ainda nem sei qual é. A dor de saber que nunca seria boa.
Inga cortava os pulsos, cortes finos, pouco sangue, enquanto eu e Ulrika pintávamos o rosto uma da outra. Pintura de guerra, pra sair e matar os demônios que o mundo criou, que nossos pais criaram.
Alguém sem rosto me cortava as costas com uma corda fina, pequenos cortes de pele, nunca nos pulsos. Eu achava que era melhor do que isso, como se alguém pudesse ser melhor do que isso.
Rainha Sofia fumava cigarros fedidos e Marcela alucinava com álcool, fumaça e Smiths.
Me lembro do cheiro do vômito, do gosto de vinho na boca de alguém, das danças bizarras de Alex, nada engraçadas, pelo menos pra mim.
Gosto de sangue, da minha boca eternamente a sangrar, mãos cortadas, meu pés de não bailarina chutando o ar, fúria incontida e infinita rasgando o tempo em gritos que eu nunca dei, ódio demais junto, virando fumaça tóxica enquanto eu brincava de ser livre e de ser única, a favorita,
No fim da noite, todos cansados, loucos, sujos, sangue no chão pra alguém limpar.
E você limpo, calmo, quieto, são, me pegava pela mão como se eu não fosse suja, como se meu sangue não fosse sujo e eu não fosse um monstro.
E, naqueles momentos, eu tinha essa certeza - essa mesma que se esconde aqui, sob minhas ideias de autonomia - de que eu faria qualquer coisa por você.
E eu fiz.
Sangue, vísceras, defendi sua honra com meus punhos, meus ossos de metal, hematomas nas pernas.
Eu quebrei estruturas frágeis, derramei sangue e orgulho.
E eu só tinha 16.
E agora eu tenho 22 e não consigo mais lutar. Por nada.
Nem por mim, nem por ninguém.
Detesto balé, cigarros, não mijo em telhados. Cansei de pílulas, de cortes.
Cansei de ser o seu monstro.
Mas não posso fazer nada sobre isso.
Eu sou como sou, como decidi ser aos 16, naquele momento em que me perguntaram se eu queria sangrar por vontade ou porque fui mandada.
Uma vez que se decide receber ordens,
nunca mais se deixa de ser um soldado.
Um interlúdio. Lembranças antigas. Talvez, as coisas tenham que ser assim.
Dei meu primeiro soco aos 9, enquanto Felipe tomava seu centésimo porre aos 13.
Mijei em telhados, 2 socos fortes no estômago, que me fizeram sentir mais dor do que achei que seria possível. Intensidade máxima, de forma que nada nunca mais se aproximou daquilo, do misto de dor e humilhação, do gosto de terra e lágrimas.
Puxões de cabelo, tarja preta.
Eu desenhava números por todo o corpo, marcas da besta que eu era, pra afastar as pessoas, pra conter o corpo, pra conter o espírito ruim, pra deixar de fora todo o resto: pra proteger o mundo de mim.
Balé, a dor de ficar de pé durante horas tentando acertar uma posição que ainda nem sei qual é. A dor de saber que nunca seria boa.
Inga cortava os pulsos, cortes finos, pouco sangue, enquanto eu e Ulrika pintávamos o rosto uma da outra. Pintura de guerra, pra sair e matar os demônios que o mundo criou, que nossos pais criaram.
Alguém sem rosto me cortava as costas com uma corda fina, pequenos cortes de pele, nunca nos pulsos. Eu achava que era melhor do que isso, como se alguém pudesse ser melhor do que isso.
Rainha Sofia fumava cigarros fedidos e Marcela alucinava com álcool, fumaça e Smiths.
Me lembro do cheiro do vômito, do gosto de vinho na boca de alguém, das danças bizarras de Alex, nada engraçadas, pelo menos pra mim.
Gosto de sangue, da minha boca eternamente a sangrar, mãos cortadas, meu pés de não bailarina chutando o ar, fúria incontida e infinita rasgando o tempo em gritos que eu nunca dei, ódio demais junto, virando fumaça tóxica enquanto eu brincava de ser livre e de ser única, a favorita,
No fim da noite, todos cansados, loucos, sujos, sangue no chão pra alguém limpar.
E você limpo, calmo, quieto, são, me pegava pela mão como se eu não fosse suja, como se meu sangue não fosse sujo e eu não fosse um monstro.
E, naqueles momentos, eu tinha essa certeza - essa mesma que se esconde aqui, sob minhas ideias de autonomia - de que eu faria qualquer coisa por você.
E eu fiz.
Sangue, vísceras, defendi sua honra com meus punhos, meus ossos de metal, hematomas nas pernas.
Eu quebrei estruturas frágeis, derramei sangue e orgulho.
E eu só tinha 16.
E agora eu tenho 22 e não consigo mais lutar. Por nada.
Nem por mim, nem por ninguém.
Detesto balé, cigarros, não mijo em telhados. Cansei de pílulas, de cortes.
Cansei de ser o seu monstro.
Mas não posso fazer nada sobre isso.
Eu sou como sou, como decidi ser aos 16, naquele momento em que me perguntaram se eu queria sangrar por vontade ou porque fui mandada.
Uma vez que se decide receber ordens,
nunca mais se deixa de ser um soldado.
26x12 Kübler-Ross, parte 4
Postado por
garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Bargain.
Bargain.
Em crise, corri para dentro o quarto, tateei as paredes até tocar
a tapeçaria.
Berrei, implorando que não a cortassem. Estava insana, doía tanto.
Eu precisava de outra chance. Não podia ser o fim.
Sentei no chão e chorei.
Morta veio até mim, tesoura na mão, me levantou o rosto e me
cortou, logo abaixo dos olhos, antes mesmo que eu pudesse me proteger.
- O que você quer exige sacrifício, explicou.
Ela passou o polegar sobre o corte e levou-o a boca. Cuspiu.
- Você é fraca, mentirosa. O seu fracasso te torna permanentemente
fraca, te persegue e pesa sobre suas costas.
Choro baixinho, quase sem ruído, enquanto ela continua.
- Existe potencial para força. Bons sentimentos que te farão
forte, melhor. Use-os.
- E agora? O que eu faço?
- Eu vejo mágoa, ressentimento, coisas não ditas. Nos seus olhos,
e nos dele, quando os vejo através dos seus.
Você precisa de ---
Prejuízo, orgulho, intolerância. Não volte atrás. Mate-o dentro de
você.
- Mas, os sentimentos bons, ....?
- Paciência. As coisas serão como tiverem que ser.
E eu faria qualquer coisa pra mudar as coisas, mas
Paciência.
26x11
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garota solteira procura,
Esse espaço está reservado para o dia 24 de julho de 2015.
Quando eu puder, escreverei.
Quando eu puder, escreverei.
26x10 Kübler-Ross, parte 3
Postado por
garota solteira procura,
Imagem: TingTin Huang
Depression.
Chegou em uma noite comum.
Eu estava sentada na sala, assistindo Cidade dos Ossos.
De repente, a voz de Ulrika "Ninguém nunca vai nos amar como somos". E eu senti uma dor enorme de uma vez só, feito um soco bem dado no rosto: ela estava certa.
Eu nunca ---
Eu guardei tantos segredos a minha vida inteira. Eu me guardei a vida inteira.
E aí você veio, feito uma promessa, feito uma profecia a se cumprir, a resposta das preces que eu fazia, por mim e por Ulrika "por favor, não deixe que ela esteja certa".
E agora essa dor no corpo todo, a dor de mim golpes, chutes e socos, o medo de voltar pra casa de me apaixonar de novo, de me desapaixonar por você, de te ver se apaixonar, de tocar alguém, de te ver, de olhar pra você e saber que você sente alívio e que sabe que tomou a decisão certa, o pavor de dormir e acordar um dia mais próxima de você.
É como se você tivesse vindo provar que ela sempre esteve certa.
Hoje, pela primeira vez, me arrependi de ter dito "sim".
Depression.
Chegou em uma noite comum.
Eu estava sentada na sala, assistindo Cidade dos Ossos.
De repente, a voz de Ulrika "Ninguém nunca vai nos amar como somos". E eu senti uma dor enorme de uma vez só, feito um soco bem dado no rosto: ela estava certa.
Eu nunca ---
Eu guardei tantos segredos a minha vida inteira. Eu me guardei a vida inteira.
E aí você veio, feito uma promessa, feito uma profecia a se cumprir, a resposta das preces que eu fazia, por mim e por Ulrika "por favor, não deixe que ela esteja certa".
E agora essa dor no corpo todo, a dor de mim golpes, chutes e socos, o medo de voltar pra casa de me apaixonar de novo, de me desapaixonar por você, de te ver se apaixonar, de tocar alguém, de te ver, de olhar pra você e saber que você sente alívio e que sabe que tomou a decisão certa, o pavor de dormir e acordar um dia mais próxima de você.
É como se você tivesse vindo provar que ela sempre esteve certa.
Hoje, pela primeira vez, me arrependi de ter dito "sim".
26x09 Kübler-Ross, parte 2
Postado por
garota solteira procura,
Imagem: TingTingHuang
Anger.
Rápido. Vai e vem.
Eu te amo. Eu te odeio, não entendo como pude sentir algo por alguém tão estúpido, babaca, desrespeitoso, ridículo, filho da mãe ----
Depois,
Passa.
Anger.
Rápido. Vai e vem.
Eu te amo. Eu te odeio, não entendo como pude sentir algo por alguém tão estúpido, babaca, desrespeitoso, ridículo, filho da mãe ----
Depois,
Passa.
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Paramore,
Pégaso,
SUPERdelayed
26x08 Kübler-Ross, parte 1
Postado por
garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Denial
Acordei no chão da sala.
Você não era mais meu.
Meu.
Você nunca foi meu, você não podia ser de alguém.
Que pena.
Dei de ombros, fui pra aula.
Vi você. E te reconheci como algo a parte, alguém que não era meu, que não era eu, que não era parte de mim. Era só você e eu era eu. Fui pra casa sufocando, sabendo que quem sufocava e morria era o nós, e que eu sobreviveria a ele. A esse nós e a muitos outros que não envolveriam você.
Senti sua falta.
Comecei a esquecer coisas, números, informações, a me irritar com tudo e todos - cada comentário , cada história, cada pedaço de informação -, fiquei apática, morta, cansada. Deixei de dormir. E, quando dormi, tive sonhos vívidos, incômodos, tolos, que me faziam acordar às 3 da manhã e ficar olhando pro nada, pro teto, pro chão.
Era abstinência.
Queria falar com você. Sobre tudo, sobe nada. Sobre nós. Sobre provas finais. Sobre filmes ou pacotes de internet.
E falei.
E me senti estúpida, tão pequena, tão boba, tão mimada, tão fraca.
Passei a te escrever mensagens em origamis que eu sei, embora não vá admitir, que eu queria que você lesse.
Eu queria você. E juro que achava que não, achava que não estava sentindo nada e, talvez, não estivesse mesmo. Foi uma época estranha.
Eu te queria, como sempre, como antes, e sabia que nunca mais iria te querer de novo.
Eu já vivia minha vida como se você não tivesse existido e isso doía, mas era uma dor surda, à qual me acostumei rápido.
Ocupei o tempo. Todo ele. Cada segundo.
E você morreu em algum canto da minha mente.
Fiz as provas, falei com você, mas você não era você. O você que eu amava estava jogado em um canto de mim e, a cada vez que nos falávamos, eu percebia, com mais força: não era você.
Dessa vez, eu não podia confundir os dois, eu não ia confundir os dois.
Comecei a beber, quando as aulas acabaram. E só fiquei sóbria na manhã em que voltei pra casa. Tinha que dirigir. E, então,obtive permissão pra morrer também, pra secar e murchar.
Mas eu estava ok.
Conversamos. Você até falou comigo.
E foi quando eu entendi que te amava. Que te queria bem. E que não iríamos voltar. Que esse tempo todo eu tinha sufocado, em parte, o alívio por não estarmos mais juntos. Por não ter mais a oportunidade de te magoar.
Adoeci uma, duas, três vezes.
E quis você. Mas você nem existia mais.
Era só eu,
como tinha que ser.
Denial
Acordei no chão da sala.
Você não era mais meu.
Meu.
Você nunca foi meu, você não podia ser de alguém.
Que pena.
Dei de ombros, fui pra aula.
Vi você. E te reconheci como algo a parte, alguém que não era meu, que não era eu, que não era parte de mim. Era só você e eu era eu. Fui pra casa sufocando, sabendo que quem sufocava e morria era o nós, e que eu sobreviveria a ele. A esse nós e a muitos outros que não envolveriam você.
Senti sua falta.
Comecei a esquecer coisas, números, informações, a me irritar com tudo e todos - cada comentário , cada história, cada pedaço de informação -, fiquei apática, morta, cansada. Deixei de dormir. E, quando dormi, tive sonhos vívidos, incômodos, tolos, que me faziam acordar às 3 da manhã e ficar olhando pro nada, pro teto, pro chão.
Era abstinência.
Queria falar com você. Sobre tudo, sobe nada. Sobre nós. Sobre provas finais. Sobre filmes ou pacotes de internet.
E falei.
E me senti estúpida, tão pequena, tão boba, tão mimada, tão fraca.
Passei a te escrever mensagens em origamis que eu sei, embora não vá admitir, que eu queria que você lesse.
Eu queria você. E juro que achava que não, achava que não estava sentindo nada e, talvez, não estivesse mesmo. Foi uma época estranha.
Eu te queria, como sempre, como antes, e sabia que nunca mais iria te querer de novo.
Eu já vivia minha vida como se você não tivesse existido e isso doía, mas era uma dor surda, à qual me acostumei rápido.
Ocupei o tempo. Todo ele. Cada segundo.
E você morreu em algum canto da minha mente.
Fiz as provas, falei com você, mas você não era você. O você que eu amava estava jogado em um canto de mim e, a cada vez que nos falávamos, eu percebia, com mais força: não era você.
Dessa vez, eu não podia confundir os dois, eu não ia confundir os dois.
Comecei a beber, quando as aulas acabaram. E só fiquei sóbria na manhã em que voltei pra casa. Tinha que dirigir. E, então,obtive permissão pra morrer também, pra secar e murchar.
Mas eu estava ok.
Conversamos. Você até falou comigo.
E foi quando eu entendi que te amava. Que te queria bem. E que não iríamos voltar. Que esse tempo todo eu tinha sufocado, em parte, o alívio por não estarmos mais juntos. Por não ter mais a oportunidade de te magoar.
Adoeci uma, duas, três vezes.
E quis você. Mas você nem existia mais.
Era só eu,
como tinha que ser.
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