Imagem: TingTing Huang
Abro a porta, que range, baixinho.
Quarto escuro, típico delas. Não consigo ver, mas esse quarto não é mesmo pra ser visto.
Ouço o ruído do tear, da tesoura. Madeira, metal, tecido.
- Estou aqui - digo.
Ninguém responde. Aos poucos, meus olhos vão se acostumando à pouca luminosidade.
Cada uma delas executa sua parte no trabalho, rapidamente, tecendo e cortando à medida em que o mundo muda, antes que mude. Velozes, as mãos viajam de um lado a outro e meus olhos se perdem.
- Eu preciso saber - digo - Estou aqui porque preciso saber quando isso vai acabar. Por favor.
Nenhuma delas para, nenhuma delas volta o rosto pra mim, de maneira que não sei qual delas pode ver adiante, quem pode me dar a resposta que preciso.
- Está doendo? - pergunta a Mãe.
- Sim.
- O que é a dor? - diz Morta, com sua vozinha infantil e sombria - Não, não venha me falar sobre vias, fibras e receptores. Quero saber da sua dor. O que é?
- Eu não sei o que você quer dizer. Só quero que passe.
- Já te demos a resposta: Paciência.
- Eu não quero esperar, Eu quero isso fora de mim!
- Ok. - responde a donzela, cuja voz raramente ouço.
Ela se levanta e, instintivamente, olho para o tear, que continua o seu trabalho, como se movido por mãos invisíveis.
- Não se preocupe, - ela diz, de costas pra mim - Ele estava aqui antes mesmo que a ideia de mim nascesse. E estará aí quando essa ideia morrer. Ela se virou pra mim, com seu único olho de todas as cores, olhou dentro de mim, viu cada traçado da minha tapeçaria.
- Sua dor não é doença. É um tributo. A antítese do seu arrependimento. Portanto, a escolha é sua. Você vai esquecer, quando quiser.
- Quanto tempo? Quando? - agarro o braço dela, impaciente, nervosa. E ela me olha como se eu não fosse nada.
- O que é o tempo, sua menina tola? O tempo é um detalhe. Você quer tempo, data, hora marcada? Eu te darei tempo. Mas você não terá coragem de usá-lo.
Uma semana.
Se você tiver a coragem necessária pra seguir em frente, pra conseguir o que quer, siga. Se você não tiver, como já não teve antes,
- E eu estava certa! Ele não era pra mim! - grito
- Se você diz, quem sou eu pra discutir?
Ela libera seu braço do meu aperto, antes de se afastar, dizendo
- Tenha uma boa semana.
Passa a mão fria no meu cabelo e volta a se sentar.
Não sinto que está sendo irônica.
Ela me deu o que eu queria.
Agora, eu só preciso fazer a escolha certa.
E eu vou fazer,
Não vou?
(Hoje acaba o prazo. Eu fiz minha escolha. Ou melhor, não fiz escolha nenhuma. Faltam 3 horas e meia para a meia noite, mas eu sei que nada vai mudar. Eu não tenho a coragem necessária pra seguir em frente. Quero o que quero, e quero agora, mesmo que machuque,Eu não sei o que essas três horas trarão, mas já sinto que desperdicei a chance de me apaixonar de novo. E não ligo.
Eu sou como sou.)
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