Imagem: TingTing Huang
Maio tá no final.
Troquei meus lençóis, passei pano no chão do quarto, separei umas roupas velhas pra doar, como é que pode alguém ter tantos sapatos e tão poucos pés?
Eu quero criar memórias.
Quero que a gente saia de casa em um dia chuvoso, vou usar minhas botas pra pisar no chão enlameado, pular poças, quero voltar com meias molhadas, tirar sua camiseta e secar meus cabelos na sua toalha.
Eu quero usar meus sapatos de namorada, minha saia secreta, meu vestido de moça comportada nas suas festas de família.
Tô guardando um sapato pra conhecer a tua irmã, as tuas amigas. E tênis pra gente ir ao cinema naqueles dias em que eu sairia até de pijamas.
Um mundão de chinelos pra ficar em casa.
Sapatilhas pra quando você me obrigar a ir ao cinema. Pra quando eu te obrigar a ir ao cinema.
Andei meio, como é que se diz?, a palavra me fugiu agora, mas é uma palavra engraçada que a Lígia usou uma vez, meio assim tristonha, macambúzia, melancólica, sorumbática (eis a palavra!) porque a vida simplesmente não acontece como eu gostaria, porque não posso simplesmente obedecer a todos os meus impulsos, porque eu tenho essa capacidade terrível de compreender quando uma decisão não é a mais acertada e posso afirmar que não sentirei falta de maio.
Não sei se posso dizer isso, mas preciso de você agora.
Por que agora?
Bom, porque sim. Eu quero você agora.
Tenho me comportado maravilhosamente bem, lavei minhas roupas, penteei meus cabelos outro dia. Eu quero você agora, justamente porque não preciso de você.
Porque minha vida tá se ajustando devagarinho, do meu jeito perdido e preguiçoso, sem pressa de você. Porque eu quero sua companhia, porque tá faltando uma coisa muito específica, tem uma necessidade que ninguém tá conseguindo preencher, ninguém mesmo, algo a ver com gosto de cheesecake de frutas vermelhas e a textura da sua boca.
Algo a ver com a Borns, provavelmente.
Mas sabe, temos um impasse,
gigantesco
homérico:
eu não sei quem você é.
Um cara me perguntou se eu estava apaixonada.
Eu tô, mas por algo abstrato, eu estou apaixonada por uma sensação constante de estar apaixonada. É como se eu estivesse com você na ponta da minha língua, tô com uma sensação permanente de ter esquecido algo, apertando meu lembrol quase que desesperadamente, tentando me lembrar
mas não consigo.
Procuro você nos rostos de todos os homens que conheço,
tô esperando ouvir aquela coisa que você vai dizer,
aquela coisa que vai me lembrar,
aquele beijo,
aquela sensação
mas ela não está em lugar algum.
Revirei meu quarto, meus diários, parte da cidade
e você não tá em lugar algum.
Sim, eu perguntei a elas sobre você, elas me responderam algo de que, por incrível que pareça, eu não me lembro.
Isso é bizarro, mas eu juro que não me lembro, só sei que tinha algo sobre a gente ser feliz, o que é legal (MUITO LEGAL), mas não ajuda muito.
Compro sorvete e fritas, faço yoga, eu danço e abandono o álcool aos poucos.
Tô tentando não te esperar porque seria estranho e incômodo, talvez doloroso, então eu leio, eu saio, eu limpo minhas botas. Mas a sensação não passa e eu às vezes sinto medo de acabar mesmo por me esquecer de você.
Quero lutar por você, quero guerra, quero fazer juras de amor e provar que estamos destinados um ao outro, você e eu.
Digo isso à Mãe, e ela ri, mas eu não sei o que isso quer dizer, se estou sendo tola, ou se ela ri porque já sabe tudo sobre nosso futuro tragicômico.
Pergunto a ela, de novo, e ela me tranquiliza, só diz "Não se preocupe, criança, vocês serão felizes".
E isso me tranquiliza, é o bastante.
Eu não sei onde você está,
eu não sei quem você é,
mas vai dar certo, ok?
Eu quero você agora, agora mesmo,
mas é como dizem
o que tiver que ser,
será.
(venha logo)
40x02 Break a leg
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Gosto de você.
Mas você não pode saber porque você não pode saber, não porque eu não queira dizer.
Dirijo, séria, e você está bêbado, me diz que me ama, mas eu sei que é da boca pra fora.
Você tá elétrico, a nossa química tá explosiva, quero você aqui e agora, te beijo no sinal vermelho e me sinto uma puta traidora, mas eu só quero você, e você tá suado.
Tyler me manda mensagem, Jack me manda mensagem, meus amigos querem sair, querem me ver, mas eu não quero ficar parada, eu quero funcionar no mesmo nível de energia que você funciona.
Você não dorme.
Se mexe na cama, levanta no meio da noite, me acorda,
acorda cedo, me chama pra conversar, beija a minha boca e flutua, fecha os olhos e volta a dormir.
Você é doido.
Eu te espero voltar pra casa, enlouquecida, desesperada,
mas você nem sabe, nem percebe, desaparece no mundo, sai voando, ou flutuando ou o que quer que você faça, vive a sua vida e volta, como se nada tivesse acontecido,
trazendo flores, um chocolate com gosto de banana, uma casquinha de sorvete, as mãos sujas com o teu futuro, teu presente, teu passado, cheiro de terebentina ou de qualquer coisa que não compreendo.
Toco suas costas, sua blusa, sua pele, seus pelos, reverencio suas costelas, essa coisa infantil no teu rosto, que você descansa no meu seio às 3 da manhã, enquanto me conta sobre o seu dia.
Você não é meu.
Você não pertence a ninguém e é a primeira vez que eu consigo entender (talvez até aceitar) que é assim que deve ser.
Você levanta o rosto, arrasta a boca até a minha, faz poesia com as batidas do meu coração, tem alguma coisa na maneira como você me toca, esse aperto que diz
eu tô aqui
- Foge comigo.
Pra longe de tudo isso.
Do lençol na janela, pra longe dessa cama, da luz do sol.
Vamos viver feito nômades, nus, nos aventurar por todos os cantos do mundo, eu cuido de você, você cuida de mim, vamos ter filhos, criá-los no meio do mato, na fronteira com o fim do mundo, ensiná-los a ler e a respeitar as pessoas, as culturas, fazer poesia, plantar flores e
Sacudo a cabeça pra afastar essa ideia maluca haha
Você me dá essas vontades estranhas de quebrar todas as regras, de virar meu mundo de cabeça pra baixo, dizer coisas que eu não deveria dizer e eu quase digo
Mas aí passa e eu olho pra você e sorrio
- Que foi? - você pergunta.
- Nada,
não foi nada.
Gosto de você.
Mas você não pode saber porque você não pode saber, não porque eu não queira dizer.
Dirijo, séria, e você está bêbado, me diz que me ama, mas eu sei que é da boca pra fora.
Você tá elétrico, a nossa química tá explosiva, quero você aqui e agora, te beijo no sinal vermelho e me sinto uma puta traidora, mas eu só quero você, e você tá suado.
Tyler me manda mensagem, Jack me manda mensagem, meus amigos querem sair, querem me ver, mas eu não quero ficar parada, eu quero funcionar no mesmo nível de energia que você funciona.
Você não dorme.
Se mexe na cama, levanta no meio da noite, me acorda,
acorda cedo, me chama pra conversar, beija a minha boca e flutua, fecha os olhos e volta a dormir.
Você é doido.
Eu te espero voltar pra casa, enlouquecida, desesperada,
mas você nem sabe, nem percebe, desaparece no mundo, sai voando, ou flutuando ou o que quer que você faça, vive a sua vida e volta, como se nada tivesse acontecido,
trazendo flores, um chocolate com gosto de banana, uma casquinha de sorvete, as mãos sujas com o teu futuro, teu presente, teu passado, cheiro de terebentina ou de qualquer coisa que não compreendo.
Toco suas costas, sua blusa, sua pele, seus pelos, reverencio suas costelas, essa coisa infantil no teu rosto, que você descansa no meu seio às 3 da manhã, enquanto me conta sobre o seu dia.
Você não é meu.
Você não pertence a ninguém e é a primeira vez que eu consigo entender (talvez até aceitar) que é assim que deve ser.
Você levanta o rosto, arrasta a boca até a minha, faz poesia com as batidas do meu coração, tem alguma coisa na maneira como você me toca, esse aperto que diz
eu tô aqui
- Foge comigo.
Pra longe de tudo isso.
Do lençol na janela, pra longe dessa cama, da luz do sol.
Vamos viver feito nômades, nus, nos aventurar por todos os cantos do mundo, eu cuido de você, você cuida de mim, vamos ter filhos, criá-los no meio do mato, na fronteira com o fim do mundo, ensiná-los a ler e a respeitar as pessoas, as culturas, fazer poesia, plantar flores e
Sacudo a cabeça pra afastar essa ideia maluca haha
Você me dá essas vontades estranhas de quebrar todas as regras, de virar meu mundo de cabeça pra baixo, dizer coisas que eu não deveria dizer e eu quase digo
Mas aí passa e eu olho pra você e sorrio
- Que foi? - você pergunta.
- Nada,
não foi nada.
40x01 Caroline's the victim
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
- Você está bem?
Faço ânsia de vômito e deixo no vaso sanitário todo o suco de laranja, pequenos pedaços de qualquer coisa.
Você está aí.
Do outro lado do vidro.
Você está aí.
Do outro lado, em outro universo, me sufocando como se estivesse a um palmo de distância.
Você está aí, no lençol que cobre a minha vista, nas cortinas permanentemente fechadas, na minha corrida até o carro de manhã, meu medo da rua escura, nos meus shorts curtos demais, nos olhares dos homens nas ruas, todos os homens são você.
Vomito.
Conto a elas sobre você.
E elas
me chamam de estúpida.
A culpa é minha.
Eu coloquei meu número lá.
Eu usei pouca roupa.
Eu não comprei cortinas.
Eu nasci mulher.
Eu me fiz desejar, eu acendi as luzes no meio da noite, eu fiquei de pé olhando pela janela.
Uma delas me diz
que somos iguais.
Isso é diferente do que eu fiz com Otto?
Isso é diferente do que você faz?
Você está aí?
Estava aí quando eu cozinhei e cantei uma canção
ou quando lavei a louça
quando me sentei no parapeito pra me despedir de um homem que amei,
quando jantei sozinha,
quando a solidão me fez bem?
A outra me diz
pra pegar uma tesoura pontuda
e matar você.
Me diz que é você ou eu.
Que ou eu te mato agora, quando você menos espera,
ou você vai estar na minha porta um dia desses,
esperando por mim.
Me diz que a vida é assim,
se eu não escolho, sou escolhida.
E eu só quero voltar no tempo.
Eu quero não saber.
Mas ela me diz
que você está aí,
que você sabe quem sou, onde moro, quantos imãs tenho na geladeira, quando saio de casa, onde estendo minha roupa, já me viu dançar
Uma me diz
que não somos muito diferentes
você só queria se aproximar
você só queria
E não soube como
Eu também não sei como
Vomito.
Eu não consigo lutar.
Eu não sei com quem lutar, eu nem sei onde você está.
Quero nunca mais sair de casa
Que não ficar em casa por sua causa
Quero abrir as janelas, todas, e andar nua pela minha casa, MINHA CASA
Quero nunca mais acender as luzes, dormir só se estiver tudo trancado, com os sofás na frente da porta
Eu não quero deixar que você me tire de mim.
Mas não tem volta, tem?
Eu não escolhi a tempo,
então fui escolhida.
- Você está bem?
Faço ânsia de vômito e deixo no vaso sanitário todo o suco de laranja, pequenos pedaços de qualquer coisa.
Você está aí.
Do outro lado do vidro.
Você está aí.
Do outro lado, em outro universo, me sufocando como se estivesse a um palmo de distância.
Você está aí, no lençol que cobre a minha vista, nas cortinas permanentemente fechadas, na minha corrida até o carro de manhã, meu medo da rua escura, nos meus shorts curtos demais, nos olhares dos homens nas ruas, todos os homens são você.
Vomito.
Conto a elas sobre você.
E elas
me chamam de estúpida.
A culpa é minha.
Eu coloquei meu número lá.
Eu usei pouca roupa.
Eu não comprei cortinas.
Eu nasci mulher.
Eu me fiz desejar, eu acendi as luzes no meio da noite, eu fiquei de pé olhando pela janela.
Uma delas me diz
que somos iguais.
Isso é diferente do que eu fiz com Otto?
Isso é diferente do que você faz?
Você está aí?
Estava aí quando eu cozinhei e cantei uma canção
ou quando lavei a louça
quando me sentei no parapeito pra me despedir de um homem que amei,
quando jantei sozinha,
quando a solidão me fez bem?
A outra me diz
pra pegar uma tesoura pontuda
e matar você.
Me diz que é você ou eu.
Que ou eu te mato agora, quando você menos espera,
ou você vai estar na minha porta um dia desses,
esperando por mim.
Me diz que a vida é assim,
se eu não escolho, sou escolhida.
E eu só quero voltar no tempo.
Eu quero não saber.
Mas ela me diz
que você está aí,
que você sabe quem sou, onde moro, quantos imãs tenho na geladeira, quando saio de casa, onde estendo minha roupa, já me viu dançar
Uma me diz
que não somos muito diferentes
você só queria se aproximar
você só queria
E não soube como
Eu também não sei como
Vomito.
Eu não consigo lutar.
Eu não sei com quem lutar, eu nem sei onde você está.
Quero nunca mais sair de casa
Que não ficar em casa por sua causa
Quero abrir as janelas, todas, e andar nua pela minha casa, MINHA CASA
Quero nunca mais acender as luzes, dormir só se estiver tudo trancado, com os sofás na frente da porta
Eu não quero deixar que você me tire de mim.
Mas não tem volta, tem?
Eu não escolhi a tempo,
então fui escolhida.
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voices
39x20 From womb to tomb (Season Finale)
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Já considerou o fato de que já nos conhecemos?
Eu te peguei no colo pela primeira vez,
fui seu pai,
sua mãe.
Eu dei o seu primeiro beijo,
eu cortei sua garganta e corri, suja com seu sangue.
Estamos destinados um ao outro, magneticamente atraídos, estrategicamente colocados em milhares de tapeçarias, que repetem diálogos, alterando detalhes, alterando cenários.
Você teima em nascer sob a mesma lua, enquanto eu dou meu primeiro grito ao pôr-do-sol.
Já nos conhecemos em uma praia, sob o sol escaldante de um deserto, enquanto você corria pela sua vida, quando eu nem sabia o que era viver.
Eu fiquei enjoada com o balanço das ondas e você voava pelos mastros e deu nós certeiros e seguros.
Eu queimei sua pele com o fogo dos meus ossos,
eu queimei sua pele em uma pira funerária e sobrevivi à você, na esperança de nos juntarmos novamente.
Minha carne febril tocou seu rosto,
e você foi o último homem do meu universo,
o primeiro,
o único.
Você me acolheu na noite da revolução,
e caminhamos pelos trilhos de trem na noite escura e fria,
seus óculos embaçando, com a fúria e a paixão das nossas expirações.
Eu dei banho no nosso primeiro filho em uma manhã fria,
você voltou pra casa cansado
e assistimos à TV usando pijamas.
Eu conheço as pontas dos seus dedos como se fossem as pontas dos meus dedos
e a sua boca é um extensão da minha.
Eu não me lembro de outras, mas me lembro da sua, mesmo sem jamais tê-la beijado,
porque eu a beijei antes.
Em outras épocas, outros mundos,
daqui a alguns anos,
décadas,
milênios,
em outro universo,
outra galáxia,
num mundo de cabeça pra baixo,
com teletransporte e um sol que faça sua pele ficar cor de rosa.
Eu termino de escrever esse texto,
aperto a sua mão
você me diz que anda tenso, que tem medo que a gente se separe, se perca,
mas eu não tenho medo,
não tenha medo
nós temos essa vida toda pela frente
e outra
e outra
e outra.
Já considerou o fato de que já nos conhecemos?
Eu te peguei no colo pela primeira vez,
fui seu pai,
sua mãe.
Eu dei o seu primeiro beijo,
eu cortei sua garganta e corri, suja com seu sangue.
Estamos destinados um ao outro, magneticamente atraídos, estrategicamente colocados em milhares de tapeçarias, que repetem diálogos, alterando detalhes, alterando cenários.
Você teima em nascer sob a mesma lua, enquanto eu dou meu primeiro grito ao pôr-do-sol.
Já nos conhecemos em uma praia, sob o sol escaldante de um deserto, enquanto você corria pela sua vida, quando eu nem sabia o que era viver.
Eu fiquei enjoada com o balanço das ondas e você voava pelos mastros e deu nós certeiros e seguros.
Eu queimei sua pele com o fogo dos meus ossos,
eu queimei sua pele em uma pira funerária e sobrevivi à você, na esperança de nos juntarmos novamente.
Minha carne febril tocou seu rosto,
e você foi o último homem do meu universo,
o primeiro,
o único.
Você me acolheu na noite da revolução,
e caminhamos pelos trilhos de trem na noite escura e fria,
seus óculos embaçando, com a fúria e a paixão das nossas expirações.
Eu dei banho no nosso primeiro filho em uma manhã fria,
você voltou pra casa cansado
e assistimos à TV usando pijamas.
Eu conheço as pontas dos seus dedos como se fossem as pontas dos meus dedos
e a sua boca é um extensão da minha.
Eu não me lembro de outras, mas me lembro da sua, mesmo sem jamais tê-la beijado,
porque eu a beijei antes.
Em outras épocas, outros mundos,
daqui a alguns anos,
décadas,
milênios,
em outro universo,
outra galáxia,
num mundo de cabeça pra baixo,
com teletransporte e um sol que faça sua pele ficar cor de rosa.
Eu termino de escrever esse texto,
aperto a sua mão
você me diz que anda tenso, que tem medo que a gente se separe, se perca,
mas eu não tenho medo,
não tenha medo
nós temos essa vida toda pela frente
e outra
e outra
e outra.
39x19 Janela Indiscreta
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Onde você está?
Eu tô sentada, casa às escuras, olhando pela fresta da cortina.
Eu tô com medo do que você sabe.
Eu quero saber tanto quanto você.
Quem é você?
Lavo meus cabelos e visto roupas limpas, mas eu ainda estou suja.
Ainda estou suja,
e valho tão pouco, sou tão pequena que minha vida toda cabe em uma janela.
Entro em casa, tranco a porta, arrasto o sofá pra frente da porta.
Mas eu não tô segura.
Eu nunca mais vou estar segura.
Lá fora ou aqui dentro, onde você pode me ver.
Onde você pode me ver cozinhar, cantar e dançar, onde você fez parte dos meus dias, me viu acordar e escrever sentada na janela no meio da noite, quando o ar no telhado parecia melhor.
Por que eu?
Se eu não sou ninguém.
Eu me sento no escuro e rezo, coisa que raramente faço, porque estou com medo, estou com muito medo de acender as luzes.
Estou com muito medo de quando a manhã chegar.
Estou com muito medo de que você me mande mensagens dizendo que ainda pode me ver, eu tapo as frestas, eu me cubro da cabeça aos pés, cada homem nas ruas carrega uma ameaça diferente, porque o seu rosto está em todos os lugares, as suas palavras estão em todas as bocas e isso me dá nojo.
Mas não me dá nojo de mim, me dá nojo de você, não se engane.
Me dá nojo de você e da sua mente tacanha que acredita que o corpo de uma mulher é seu só porque você a viu seminua.
Que ela é uma vagabunda por se expor, em qualquer lugar que seja.
Que seus motivos eram nobres, que suas palavras de alguma forma fariam sentido, que elas me fariam ter qualquer coisa diferente de náusea.
Eu tô com medo.
E daria qualquer coisa pra não estar.
Pra abrir mais as janelas e andar como bem quisesse.
Porque o seu fetiche, a tua masturbação, a tua estupidez, o porco que você é, nada disso é problema meu.
Nada disso deveria me afetar.
Mas, ao invés de pegar uma faca e cortar fora os teus dedos, chamar a polícia, fazer um escândalo, gritar pro mundo como você é um lixo,
eu tô sentada na janela, olhando por uma fresta,
petrificada,
com medo de respirar,
de me mover,
usar pijamas,
sair de casa quando a manhã chega,
falar sobre o assunto.
Eu tô finalmente entendendo
que as pessoas vão te dar razão.
Tô ouvindo elas dizerem
que eu deveria ter colocado cortinas
se ia andar feito uma vagabunda
na minha própria casa.
Eu tô ouvindo as pessoas simplificarem
e banalizarem
dizendo
Bloqueia e pronto
Tô ouvindo as pessoas
me dizerem que fiz bem em dizer que eu tinha namorado
porque nada como um homem, inexistente ou não, pra me defender.
Uma ou outra garota revoltada, um cara ou outro.
De que isso me serve?
De que isso me serve, porra?
Ele ainda está lá.
Do outro lado da minha janela.
E eu nem sequer sei onde.
Ele está lá.
Sabe onde eu moro.
Sabe quem eu sou.
Quando eu acordo.
Quando eu como.
Ele vê minhas luzes acesas e sabe que estou em casa.
Ele sabe que cheguei.
Eu não quero falar sobre isso
eu não quero pensar sobre isso
eu não quero mais imaginar que ele se senta lá do outro lado e olha pra mim,
eu não quero pensar sobre o que ele pensa quando me vê,
eu não quero que ele saiba quando vou ao banheiro
eu não quero pensar nas vezes em que eu esqueci a toalha no quarto e não tinha ninguém em casa, as vezes em que olhei rápido pela janela pra ver se tinha alguém lá - e nunca tinha
e nada disso é tão ruim, nada disso me faz ficar acordada, olhando, rezando, remoendo.
Nada é tão brutal
tão assustador
tão terrível
quanto não ter certeza se ele sabe que
não moro sozinha.
Onde você está?
Eu tô sentada, casa às escuras, olhando pela fresta da cortina.
Eu tô com medo do que você sabe.
Eu quero saber tanto quanto você.
Quem é você?
Lavo meus cabelos e visto roupas limpas, mas eu ainda estou suja.
Ainda estou suja,
e valho tão pouco, sou tão pequena que minha vida toda cabe em uma janela.
Entro em casa, tranco a porta, arrasto o sofá pra frente da porta.
Mas eu não tô segura.
Eu nunca mais vou estar segura.
Lá fora ou aqui dentro, onde você pode me ver.
Onde você pode me ver cozinhar, cantar e dançar, onde você fez parte dos meus dias, me viu acordar e escrever sentada na janela no meio da noite, quando o ar no telhado parecia melhor.
Por que eu?
Se eu não sou ninguém.
Eu me sento no escuro e rezo, coisa que raramente faço, porque estou com medo, estou com muito medo de acender as luzes.
Estou com muito medo de quando a manhã chegar.
Estou com muito medo de que você me mande mensagens dizendo que ainda pode me ver, eu tapo as frestas, eu me cubro da cabeça aos pés, cada homem nas ruas carrega uma ameaça diferente, porque o seu rosto está em todos os lugares, as suas palavras estão em todas as bocas e isso me dá nojo.
Mas não me dá nojo de mim, me dá nojo de você, não se engane.
Me dá nojo de você e da sua mente tacanha que acredita que o corpo de uma mulher é seu só porque você a viu seminua.
Que ela é uma vagabunda por se expor, em qualquer lugar que seja.
Que seus motivos eram nobres, que suas palavras de alguma forma fariam sentido, que elas me fariam ter qualquer coisa diferente de náusea.
Eu tô com medo.
E daria qualquer coisa pra não estar.
Pra abrir mais as janelas e andar como bem quisesse.
Porque o seu fetiche, a tua masturbação, a tua estupidez, o porco que você é, nada disso é problema meu.
Nada disso deveria me afetar.
Mas, ao invés de pegar uma faca e cortar fora os teus dedos, chamar a polícia, fazer um escândalo, gritar pro mundo como você é um lixo,
eu tô sentada na janela, olhando por uma fresta,
petrificada,
com medo de respirar,
de me mover,
usar pijamas,
sair de casa quando a manhã chega,
falar sobre o assunto.
Eu tô finalmente entendendo
que as pessoas vão te dar razão.
Tô ouvindo elas dizerem
que eu deveria ter colocado cortinas
se ia andar feito uma vagabunda
na minha própria casa.
Eu tô ouvindo as pessoas simplificarem
e banalizarem
dizendo
Bloqueia e pronto
Tô ouvindo as pessoas
me dizerem que fiz bem em dizer que eu tinha namorado
porque nada como um homem, inexistente ou não, pra me defender.
Uma ou outra garota revoltada, um cara ou outro.
De que isso me serve?
De que isso me serve, porra?
Ele ainda está lá.
Do outro lado da minha janela.
E eu nem sequer sei onde.
Ele está lá.
Sabe onde eu moro.
Sabe quem eu sou.
Quando eu acordo.
Quando eu como.
Ele vê minhas luzes acesas e sabe que estou em casa.
Ele sabe que cheguei.
Eu não quero falar sobre isso
eu não quero pensar sobre isso
eu não quero mais imaginar que ele se senta lá do outro lado e olha pra mim,
eu não quero pensar sobre o que ele pensa quando me vê,
eu não quero que ele saiba quando vou ao banheiro
eu não quero pensar nas vezes em que eu esqueci a toalha no quarto e não tinha ninguém em casa, as vezes em que olhei rápido pela janela pra ver se tinha alguém lá - e nunca tinha
e nada disso é tão ruim, nada disso me faz ficar acordada, olhando, rezando, remoendo.
Nada é tão brutal
tão assustador
tão terrível
quanto não ter certeza se ele sabe que
não moro sozinha.
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vagão
39x18 Entrelinhas
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Eu não sei.
Dou de ombros.
Cruzo as pernas, coço a cabeça, não tô entendendo direito o que tá acontecendo, se sou eu, se é você, o meu período fértil, a lua cheia ou a solidão.
Eu quero a sua boca,
ou eu quero você?
Ou nenhuma das duas coisas?
Não me entendo.
Um dia eu tô perseguindo o Connor,
no outro você,
falo com você, te amo
te odeio
te amo
te odeio
me acho burra,
me acho certa
aí você responde
eu respondo
e fim
Era isso?
Foi por esse diálogo lacônico que esperei por dias?
Não, não, eu fiz algo errado,
eu só posso ter feito algo errado.
De novo, feito uma criança que é empurrada a contragosto,
tento.
Você responde.
Eu respondo.
E fim.
óbvio pra alguém assim, menos pisciano:
se você quisesse falar comigo, teria falado.
Mas ó, foi exatamente o que eu fiz:
queria e falei.
O que há de errado nisso?
Em não querer jogar, em querer ser sincera.
É o que eu quero,
é como eu me sinto nas segundas-feiras, vontades incontroláveis de caras aleatórios.
Eu podia perder meu tempo lendo nas entrelinhas,
decifrando os códigos,
forçando assuntos e conversas,
eu podia dar tratos à bola por horas, em busca de um assunto que te interessasse.
Mas eu não quero forçar isso,
nem conversas,
nem encontros,
nem beijos.
Tem que ser natural,
fluido,
feito amigos que se encontram depois de anos e conversam sobre tudo,
feito lembranças antigas,
feito conversas sobre filmes,
feito sorvete e planos para o futuro.
Tem tanto assunto no mundo, moço,
tanta risada pra dar,
uma semana horrível pra contar histórias que espero que fiquem engraçadas daqui a alguns dias,
eu tenho tanto pra te perguntar,
tanto pra te dizer.
Mas não posso fazer isso,
se você não quiser saber.
Disso eu sei, sem precisar de manuais,
diretrizes, conselhos,
a habilidade de ler nas entrelinhas
ou de ler seus pensamentos.
É óbvio.
Até pra mim.
Desejo que a gente se fale/veja/beije de novo,
mas não vou ficar esperando sentada.
Não mesmo.
Tenho mais o que fazer,
e espero que você também.
Eu não sei.
Dou de ombros.
Cruzo as pernas, coço a cabeça, não tô entendendo direito o que tá acontecendo, se sou eu, se é você, o meu período fértil, a lua cheia ou a solidão.
Eu quero a sua boca,
ou eu quero você?
Ou nenhuma das duas coisas?
Não me entendo.
Um dia eu tô perseguindo o Connor,
no outro você,
falo com você, te amo
te odeio
te amo
te odeio
me acho burra,
me acho certa
aí você responde
eu respondo
e fim
Era isso?
Foi por esse diálogo lacônico que esperei por dias?
Não, não, eu fiz algo errado,
eu só posso ter feito algo errado.
De novo, feito uma criança que é empurrada a contragosto,
tento.
Você responde.
Eu respondo.
E fim.
óbvio pra alguém assim, menos pisciano:
se você quisesse falar comigo, teria falado.
Mas ó, foi exatamente o que eu fiz:
queria e falei.
O que há de errado nisso?
Em não querer jogar, em querer ser sincera.
É o que eu quero,
é como eu me sinto nas segundas-feiras, vontades incontroláveis de caras aleatórios.
Eu podia perder meu tempo lendo nas entrelinhas,
decifrando os códigos,
forçando assuntos e conversas,
eu podia dar tratos à bola por horas, em busca de um assunto que te interessasse.
Mas eu não quero forçar isso,
nem conversas,
nem encontros,
nem beijos.
Tem que ser natural,
fluido,
feito amigos que se encontram depois de anos e conversam sobre tudo,
feito lembranças antigas,
feito conversas sobre filmes,
feito sorvete e planos para o futuro.
Tem tanto assunto no mundo, moço,
tanta risada pra dar,
uma semana horrível pra contar histórias que espero que fiquem engraçadas daqui a alguns dias,
eu tenho tanto pra te perguntar,
tanto pra te dizer.
Mas não posso fazer isso,
se você não quiser saber.
Disso eu sei, sem precisar de manuais,
diretrizes, conselhos,
a habilidade de ler nas entrelinhas
ou de ler seus pensamentos.
É óbvio.
Até pra mim.
Desejo que a gente se fale/veja/beije de novo,
mas não vou ficar esperando sentada.
Não mesmo.
Tenho mais o que fazer,
e espero que você também.
39x17 Don't freek out
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Ah, eu não sei nada sobre relacionamentos.
Como é que se conversa com rapazes? Eu posso mesmo falar sobre gente morta no meio de uma conversa? Sei lá.
Eu sou estranha. Você fala primeiro, porque eu nunca sei em que pé estamos.
Sou insegura, será que meu cabelo tá legal, será que meu rosto tá fazendo aquela careta, será que eu tô dançando feito uma maluca no meio do salão?
Será que a gente fica junto agora
ou a gente fica junto pra sempre?
E aí? O que eu faço?
E se eu te mandar embora e for você?
Ou se eu disser que sim e estivermos perdendo tempo?
E se eu quiser te beijar mais?
E se eu quiser dar tudo de mim, se eu quiser te deixar chegar até a segunda base?
Você vai embora?
Vai me deixar pra trás?
Eu deveria fingir que não quero o mesmo que você?
Ah, eu não sou assim,
não sou quietinha não.
Eu mordo a sua boca, porque eu quero você, eu não quero mais ninguém, eu quero você,
agora.
Eu respiro fundo e me controlo da melhor maneira possível, pra não te assustar.
Mas meu melhor amigo de arco-íris me fez perceber que,
se você se assusta com uma coisa tão pequena,
então não vale o meu tempo.
Eu sou intensa, é noite de lua cheia,
eu quero te levar pra casa,
eu quero não voltar pra casa,
e é por isso que eu volto.
Porque eu fico o tempo todo me segurando,
me amarrando no porão.
Só que hoje não, eu sinto muito.
Eu me sentei no sofá, tranquila,
ele vai dizer alguma coisa.
Ele vai puxar conversa,
eu só vou ter que pensar antes de falar as coisas, um pouquinho mais.
Marquei horas no relógio, limites de tempo pra prever teu interesse,
até que me dei conta de que isso era loucura.
Porra, mulher, SE ACALMA
você é linda.
E engraçada, embora seu senso de humor seja duvidoso.
Beija bem pra caralho, ô moça, eu sou apaixonada por você.
Mulherão da porra desse, vai ficar em casa sentada esperando que ele aja?
Pois aja você.
Se você quer saber,
pergunte.
Não vale a pena desperdiçar teu domingo se perguntando e se
Pensando se ele vem,
se foi alguma coisa que você fez ou deixou de fazer
que disse ou deixou de dizer
uma piada mal contada
um beijo sofrível.
Nem todo mundo que a gente beija e gosta é pra casar, pisciana doida.
Vê se manda mensagem e espera resposta,
sem sofrer,
sem ansiar tanto,
sem joguinhos.
Você quer,
está dito,
enviado
e pronto.
Basta.
Vê se não enlouquece ainda,
tem muito homem no mundo pra te virar a cabeça.
Um deles é o certo.
(Talvez, até mais de um)
Ah, eu não sei nada sobre relacionamentos.
Como é que se conversa com rapazes? Eu posso mesmo falar sobre gente morta no meio de uma conversa? Sei lá.
Eu sou estranha. Você fala primeiro, porque eu nunca sei em que pé estamos.
Sou insegura, será que meu cabelo tá legal, será que meu rosto tá fazendo aquela careta, será que eu tô dançando feito uma maluca no meio do salão?
Será que a gente fica junto agora
ou a gente fica junto pra sempre?
E aí? O que eu faço?
E se eu te mandar embora e for você?
Ou se eu disser que sim e estivermos perdendo tempo?
E se eu quiser te beijar mais?
E se eu quiser dar tudo de mim, se eu quiser te deixar chegar até a segunda base?
Você vai embora?
Vai me deixar pra trás?
Eu deveria fingir que não quero o mesmo que você?
Ah, eu não sou assim,
não sou quietinha não.
Eu mordo a sua boca, porque eu quero você, eu não quero mais ninguém, eu quero você,
agora.
Eu respiro fundo e me controlo da melhor maneira possível, pra não te assustar.
Mas meu melhor amigo de arco-íris me fez perceber que,
se você se assusta com uma coisa tão pequena,
então não vale o meu tempo.
Eu sou intensa, é noite de lua cheia,
eu quero te levar pra casa,
eu quero não voltar pra casa,
e é por isso que eu volto.
Porque eu fico o tempo todo me segurando,
me amarrando no porão.
Só que hoje não, eu sinto muito.
Eu me sentei no sofá, tranquila,
ele vai dizer alguma coisa.
Ele vai puxar conversa,
eu só vou ter que pensar antes de falar as coisas, um pouquinho mais.
Marquei horas no relógio, limites de tempo pra prever teu interesse,
até que me dei conta de que isso era loucura.
Porra, mulher, SE ACALMA
você é linda.
E engraçada, embora seu senso de humor seja duvidoso.
Beija bem pra caralho, ô moça, eu sou apaixonada por você.
Mulherão da porra desse, vai ficar em casa sentada esperando que ele aja?
Pois aja você.
Se você quer saber,
pergunte.
Não vale a pena desperdiçar teu domingo se perguntando e se
Pensando se ele vem,
se foi alguma coisa que você fez ou deixou de fazer
que disse ou deixou de dizer
uma piada mal contada
um beijo sofrível.
Nem todo mundo que a gente beija e gosta é pra casar, pisciana doida.
Vê se manda mensagem e espera resposta,
sem sofrer,
sem ansiar tanto,
sem joguinhos.
Você quer,
está dito,
enviado
e pronto.
Basta.
Vê se não enlouquece ainda,
tem muito homem no mundo pra te virar a cabeça.
Um deles é o certo.
(Talvez, até mais de um)
39x16 Coisas que a gente ainda não sabe
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
- Oi
Bato na parede, e você responde
- Oi
Coloco a boca o mais próximo que posso da única fresta que temos pra nos comunicar, esse buraco no espaço-tempo, por onde passa o fio vermelho que vai nos unir em algum momento.
Eu me aconchego perto da parede gelada, pra ouvir melhor a tua voz, pra falar melhor.
Quero te contar sobre os meus dias.
Eu tô cansada.
Tão cansada.
Mas resisto, eu luto contra essa vontade de não tentar.
Eu acordo de manhã e me levanto da cama, homem, e isso me custa tanto que você nem faz ideia.
Eu conto sobre essa coisa que tô ignorando, sobre esse cara que eu acho que é você (e você ri, sei lá se acertei ou errei), sobre uma coisa que comi, uma dança engraçada, a vontade de ficar bêbada e o medo de ficar só.
Você me conta coisas.
Coisas que eu ainda não sei.
Que eu não devo saber, me ensina uma conta, uma poesia, uma canção, me ensina a te encontrar aqui e agora.
Mas eu não entendo nada.
Eu só sei ouvir a sua voz.
Tento não me preocupar, mas não sei se consigo.
Você tá aí, eu tô aqui.
Por que a gente não simplesmente derruba a parede e dá as mãos?
Por que a gente não encontra o final desse muro, por que não pulamos o muro, por que não construímos uma escada, abrimos mais essa fresta?
Eu me levanto, agitada, eu grito, eu faço planos
e você me diz pra ter paciência
paciência, mulher
Mais dia, menos dia
a fresta se abre,
uma escada aparece,
o muro cai
e eu te levo
pro exato momento em que a gente se encontra.
Paciência.
Como eu odeio essa palavra.
Deixe estar.
Mais dia, menos dia
vamos nos encontrar no lugar exato,
na hora exata,
que a gente ainda não sabe qual é,
e eu tenho a leve impressão de que vai parecer até que a gente sempre soube.
Até logo.
- Oi
Bato na parede, e você responde
- Oi
Coloco a boca o mais próximo que posso da única fresta que temos pra nos comunicar, esse buraco no espaço-tempo, por onde passa o fio vermelho que vai nos unir em algum momento.
Eu me aconchego perto da parede gelada, pra ouvir melhor a tua voz, pra falar melhor.
Quero te contar sobre os meus dias.
Eu tô cansada.
Tão cansada.
Mas resisto, eu luto contra essa vontade de não tentar.
Eu acordo de manhã e me levanto da cama, homem, e isso me custa tanto que você nem faz ideia.
Eu conto sobre essa coisa que tô ignorando, sobre esse cara que eu acho que é você (e você ri, sei lá se acertei ou errei), sobre uma coisa que comi, uma dança engraçada, a vontade de ficar bêbada e o medo de ficar só.
Você me conta coisas.
Coisas que eu ainda não sei.
Que eu não devo saber, me ensina uma conta, uma poesia, uma canção, me ensina a te encontrar aqui e agora.
Mas eu não entendo nada.
Eu só sei ouvir a sua voz.
Tento não me preocupar, mas não sei se consigo.
Você tá aí, eu tô aqui.
Por que a gente não simplesmente derruba a parede e dá as mãos?
Por que a gente não encontra o final desse muro, por que não pulamos o muro, por que não construímos uma escada, abrimos mais essa fresta?
Eu me levanto, agitada, eu grito, eu faço planos
e você me diz pra ter paciência
paciência, mulher
Mais dia, menos dia
a fresta se abre,
uma escada aparece,
o muro cai
e eu te levo
pro exato momento em que a gente se encontra.
Paciência.
Como eu odeio essa palavra.
Deixe estar.
Mais dia, menos dia
vamos nos encontrar no lugar exato,
na hora exata,
que a gente ainda não sabe qual é,
e eu tenho a leve impressão de que vai parecer até que a gente sempre soube.
Até logo.
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39x15 Do I wanna know?
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
- Eu tô chateada.
- Não, não tá não, ela diz, você consegue fazer melhor do que isso.
Não, não consigo.
Ela enfia alfinetes no meu peito, um de cada vez, e eu fico enjoada, mas não choro.
Eu não choro mais, eu nem sei como.
Ela quer me ouvir dizer que tô com raiva, que tô magoada, profundamente machucada,
mas eu não vou dizer.
O que eu tô sentindo não é só isso, não é bem isso.
Não dá pra ser só raiva, não dá pra ser só mágoa.
Eu tô com a sensação de estar com os ossos partidos, sozinha em casa numa tarde de domingo, com as janelas fechadas e a garganta tão seca que não dá pra emitir nenhum ruído.
Eu tô me sentindo sufocada em relacionamentos que eu nem tenho.
Eu não tô brava, eu tô triste.
De um jeito que todos os chocolates do mundo não vão consertar, não é de chocolate que eu preciso, eu preciso saber que posso confiar em você.
E eu não sei se posso.
E eu sei que não posso.
Nada contra o melhor ser humano do universo, mas deve ter algo de errado quando a única pessoa em que você confia pra contar certas coisas é alguém que não pode te contar nada.
Não existe reciprocidade.
Mas é seguro. E é mais verdadeiro do que todo o resto, pelo menos agora.
Ela quer que eu diga que me sinto traída ou que se foda, mas eu só me sinto estúpida.
De novo.
Eu só sinto um grande nada, uma grande não-proximidade, uma sensação que me afasta de todas as pessoas em quem já confiei, que me aproxima de estranhos nas ruas e em reuniões, de pessoas que não conseguem se aproximar demais, de gente que me dá bom dia e quer saber como vai a minha vida, de gente que quer ficar até depois das 21 horas.
Eu não quero te contar meus segredos, eu não quero saber os seus segredos, se você tá bem ou mal, em surto ou remissão.
Não confie em mim porque eu não vou confiar em você.
E não é só que eu não queira, eu não consigo.
E nem quero conseguir.
O que você sabe sobre mim, sobre quem eu sou agora?
Por que essa necessidade gigantesca de guardar segredos, por que eu simplesmente não me sento e falo sobre janeiro?
Por que não só digo o que eu faço todas as terças e quintas?
Ou o que é verdade e o que é mentira, o que aconteceu anteontem à noite, o que tá acontecendo agora e o que houve no jantar?
O que minha mãe disse ou o quanto eu tô assustada,
ou a razão pela qual você nunca se pergunta essas coisas, ou por que tá tudo bem enquanto eu te fizer rir?
Tá tudo bem enquanto eu não disser nada, certo?
E eu não vou dizer nada.
Eu não tenho nada pra dizer.
- Eu tô chateada.
- Não, não tá não, ela diz, você consegue fazer melhor do que isso.
Não, não consigo.
Ela enfia alfinetes no meu peito, um de cada vez, e eu fico enjoada, mas não choro.
Eu não choro mais, eu nem sei como.
Ela quer me ouvir dizer que tô com raiva, que tô magoada, profundamente machucada,
mas eu não vou dizer.
O que eu tô sentindo não é só isso, não é bem isso.
Não dá pra ser só raiva, não dá pra ser só mágoa.
Eu tô com a sensação de estar com os ossos partidos, sozinha em casa numa tarde de domingo, com as janelas fechadas e a garganta tão seca que não dá pra emitir nenhum ruído.
Eu tô me sentindo sufocada em relacionamentos que eu nem tenho.
Eu não tô brava, eu tô triste.
De um jeito que todos os chocolates do mundo não vão consertar, não é de chocolate que eu preciso, eu preciso saber que posso confiar em você.
E eu não sei se posso.
E eu sei que não posso.
Nada contra o melhor ser humano do universo, mas deve ter algo de errado quando a única pessoa em que você confia pra contar certas coisas é alguém que não pode te contar nada.
Não existe reciprocidade.
Mas é seguro. E é mais verdadeiro do que todo o resto, pelo menos agora.
Ela quer que eu diga que me sinto traída ou que se foda, mas eu só me sinto estúpida.
De novo.
Eu só sinto um grande nada, uma grande não-proximidade, uma sensação que me afasta de todas as pessoas em quem já confiei, que me aproxima de estranhos nas ruas e em reuniões, de pessoas que não conseguem se aproximar demais, de gente que me dá bom dia e quer saber como vai a minha vida, de gente que quer ficar até depois das 21 horas.
Eu não quero te contar meus segredos, eu não quero saber os seus segredos, se você tá bem ou mal, em surto ou remissão.
Não confie em mim porque eu não vou confiar em você.
E não é só que eu não queira, eu não consigo.
E nem quero conseguir.
O que você sabe sobre mim, sobre quem eu sou agora?
Por que essa necessidade gigantesca de guardar segredos, por que eu simplesmente não me sento e falo sobre janeiro?
Por que não só digo o que eu faço todas as terças e quintas?
Ou o que é verdade e o que é mentira, o que aconteceu anteontem à noite, o que tá acontecendo agora e o que houve no jantar?
O que minha mãe disse ou o quanto eu tô assustada,
ou a razão pela qual você nunca se pergunta essas coisas, ou por que tá tudo bem enquanto eu te fizer rir?
Tá tudo bem enquanto eu não disser nada, certo?
E eu não vou dizer nada.
Eu não tenho nada pra dizer.
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39x14 Are you Randy?
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
É maio.
Fuck.
Fugg.
Acordo em maio, sem poder impedir, sem poder parar, em uma cama que não é a minha.
Segura, no centro de um mundo que não é o meu.
E tudo bem.
Meu melhor amigo de arco-íris salva a minha vida, de novo.
Eu o amo, mas não é como as pessoas pensam, as pessoas confundem as coisas.
É maio, não é hora de confundir as coisas então eu ofereço uma carona a ele, Pégaso.
E nos sentamos em um carro, o meu carro
nosso carro
Em uma realidade paralela, anos-luz atrás, a gente já se deitou nesses bancos e olhou as estrelas.
Você já disse que me amava aqui dentro, me pediu em namoro aqui.
Mas isso foi há muito tempo,
eu olho nos seus olhos e vejo
que não te conheço mais.
E você não sabe mais tanto assim sobre mim, não como pensa que sabe, então eu ligo o carro
E mando uma mensagem para Tyler.
Porque é maio.
Porque eu gosto de apostar todas as minhas fichas em maio, eu gosto de girar a roleta do destino, de brincar com o que as cartas dizem, eu gosto de lutar contra o que eu sei.
Ele me responde.
E eu rio, ele me faz rir, não me sufoca, nem exige minha atenção integral.
Ele me faz sentir que eu estou pronta,
eu estou pronta pro que vai acontecer.
Um cara fala comigo e ele olha nos meus olhos,
3 segundos mississipi,
e eu simplesmente sei que tô quase lá,
que alguma coisa vai acontecer,
talvez não aqui,
talvez não agora,
nem amanhã.
Quando eu estiver pronta, quando eu tiver tempo,
quando a liga não for a coisa mais importante e excitante da minha vida,
quando eu quiser me importar com outra pessoa.
Mas eu consigo sentir algo cozinhando,
consigo sentir de longe o cheiro da tinta e do tecido do meu destino,
nos olhos vermelhos de uma garota que é uma garota,
no roxo do rosto desse cara,
fios de barba que nunca crescem o bastante,
uma pinta atrás das orelhas,
o verde-amarelado nos olhos de uma garota,
cabelos crescendo rápido demais,
escorpiões,
e a proximidade das festas juninas.
Eu não sei pra onde ir, o que fazer,
o que vestir
se caso ou compro uma bicicleta,
se beijo você só pra saber como é
ou se fico em casa e durmo.
Mas eu sei que, o que quer que esteja vindo,
vai me alcançar, de um jeito ou de outro.
Que a loucura de maio vai me atacar em algum momento,
que eu vou parar na porta da sua casa, da casa de alguém,
fazendo o que eu queria que alguém fizesse por mim,
tendo a coragem que eu acho que as pessoas deveriam ter,
embriagada de amor ou de algum sentimento igualmente bizarro
é maio, caralho
Não tem pra onde fugir.
E eu também não quero fugir.
Vamo.
É maio.
Fuck.
Fugg.
Acordo em maio, sem poder impedir, sem poder parar, em uma cama que não é a minha.
Segura, no centro de um mundo que não é o meu.
E tudo bem.
Meu melhor amigo de arco-íris salva a minha vida, de novo.
Eu o amo, mas não é como as pessoas pensam, as pessoas confundem as coisas.
É maio, não é hora de confundir as coisas então eu ofereço uma carona a ele, Pégaso.
E nos sentamos em um carro, o meu carro
nosso carro
Em uma realidade paralela, anos-luz atrás, a gente já se deitou nesses bancos e olhou as estrelas.
Você já disse que me amava aqui dentro, me pediu em namoro aqui.
Mas isso foi há muito tempo,
eu olho nos seus olhos e vejo
que não te conheço mais.
E você não sabe mais tanto assim sobre mim, não como pensa que sabe, então eu ligo o carro
E mando uma mensagem para Tyler.
Porque é maio.
Porque eu gosto de apostar todas as minhas fichas em maio, eu gosto de girar a roleta do destino, de brincar com o que as cartas dizem, eu gosto de lutar contra o que eu sei.
Ele me responde.
E eu rio, ele me faz rir, não me sufoca, nem exige minha atenção integral.
Ele me faz sentir que eu estou pronta,
eu estou pronta pro que vai acontecer.
Um cara fala comigo e ele olha nos meus olhos,
3 segundos mississipi,
e eu simplesmente sei que tô quase lá,
que alguma coisa vai acontecer,
talvez não aqui,
talvez não agora,
nem amanhã.
Quando eu estiver pronta, quando eu tiver tempo,
quando a liga não for a coisa mais importante e excitante da minha vida,
quando eu quiser me importar com outra pessoa.
Mas eu consigo sentir algo cozinhando,
consigo sentir de longe o cheiro da tinta e do tecido do meu destino,
nos olhos vermelhos de uma garota que é uma garota,
no roxo do rosto desse cara,
fios de barba que nunca crescem o bastante,
uma pinta atrás das orelhas,
o verde-amarelado nos olhos de uma garota,
cabelos crescendo rápido demais,
escorpiões,
e a proximidade das festas juninas.
Eu não sei pra onde ir, o que fazer,
o que vestir
se caso ou compro uma bicicleta,
se beijo você só pra saber como é
ou se fico em casa e durmo.
Mas eu sei que, o que quer que esteja vindo,
vai me alcançar, de um jeito ou de outro.
Que a loucura de maio vai me atacar em algum momento,
que eu vou parar na porta da sua casa, da casa de alguém,
fazendo o que eu queria que alguém fizesse por mim,
tendo a coragem que eu acho que as pessoas deveriam ter,
embriagada de amor ou de algum sentimento igualmente bizarro
é maio, caralho
Não tem pra onde fugir.
E eu também não quero fugir.
Vamo.
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39x13 Esquecer de lembrar
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Estava em casa, deitada e despertei.
Despertei, mas não estive dormindo.
Eu simplesmente estive.
Eu quis pão, e a memória do gosto de pão invadiu meu corpo, acordou meu eu de 8 anos: me lembrei do meu nome.
Lembrei-me do rosto da minha mãe e da risada da vizinha da minha falecida avó.
Eu me sentei na cama, lentamente, com muita dor, arranquei tudo o que me prendia a um mundo de esquecimento, meu corpo de novo forte, mesmo que enrugado e seco, murcho.
Quis escrever, apanhei lápis e papel no criado mundo, e as palavras me vieram, mas a mão não soube traduzí-las.
Tremi.
Rasguei o papel, joguei o lápis no chão, eu tive uma ideia, uma ideia que ia mudar o mundo, eu sabia o significado da vida, eu me lembrei,
eu me lembrei de como se construía um castelo de areia, a cor dos olhos do meu melhor amigo de infância, eu me lembrei do gosto da boca do pai dos meus filhos no nosso terceiro encontro, a minha poesia favorita e como engolir.
Eu me lembrei, e todo o meu corpo despertou num dia estranho, numa casa estranha, eu senti um medo quase paralisante de me olhar no espelho e descobrir que o pior havia acontecido.
Descobrir que eu tinha me esquecido.
Eu me levantei da cama aos poucos, eu fiz uma dança rígida, procurei uma roupa, eu estava viva, eu me lembrei, eu me lembrei, dancei e gritei ao som da música que o rubel cantou em um show que deve ter acontecido há uns 50 anos, eu era a moça que grita, eu queria amar de novo. Eu quero.
Ouvi passos lá fora, uma porta se abriu lá longe e eu sabia que era você, eu sabia porque eu sabia que só podíamos ter envelhecido juntos, mesmo que eu não conseguisse me lembrar dos detalhes, eu sabia, e eu queria te dizer que eu me lembrei, eu me lembrei de te amar e da nossa primeira dança lenta, do seu sorriso e do seu cheiro.
Fui até a porta pra te encontrar, mas minhas pernas fraquejaram e eu me esqueci como se andava, caí no chão, esqueci, eu esqueci como engolir a saliva e babei, não sabia mais abrir a boca, mas eu sabia escrever.
Eu sabia escrever, mesmo trêmula, eu sabia, eu precisava te dizer,
eu precisava que você soubesse.
Me arrastei, desesperada, até o papel e a caneta, mas, a dois passos curtos, emus braços e mãos se esqueceram o que era movimento, o corpo me traiu, virou um peso morto pra minha mente leve e eu chorei, jogada no chão, toda torta, fiz ruídos desconexos de palavras que minha mente conhecia, mas minha boca não sabia dizer.
E foi aí que você entrou, um minuto atrasado, trazendo seu cheiro, sua voz e uma juventude que eu não esperava. Era você e não era, era eu também, nos olhos de um estranho completo, tão familiar que eu podia jurar que era parte de mim.
Não era você,
era nós, a personificação de nós dois.
- Mãe?! O que aconteceu?
Eu tentei responder, eu tentei perguntar o nome dele, eu precisava saber, eu queria saber o que houve com você, o que houve comigo, mas ele não me respondeu, me pegou no colo, colocou na cama e me limpou, me cobriu.
Tentei chamar a atenção dele, eu queria saber, "eu estou aqui, eu me lembro", tentei dizer.
Mas o corpo, implacável, apagou as luzes aos pouquinhos,
apagou os primeiros anos, os meses, semanas, dias, amores, mágoas, meu primeiro beijo, citações, seu rosto. Apagou o seu rosto.
E, só então, apagou o meu, minha personalidade rude, minha preferência por Hershey's de amendoim e cajá-manga,
apagou tudo, tudo
de forma tão brutalmente eficaz
que eu me esqueci até
como é que se lembra.
Estava em casa, deitada e despertei.
Despertei, mas não estive dormindo.
Eu simplesmente estive.
Eu quis pão, e a memória do gosto de pão invadiu meu corpo, acordou meu eu de 8 anos: me lembrei do meu nome.
Lembrei-me do rosto da minha mãe e da risada da vizinha da minha falecida avó.
Eu me sentei na cama, lentamente, com muita dor, arranquei tudo o que me prendia a um mundo de esquecimento, meu corpo de novo forte, mesmo que enrugado e seco, murcho.
Quis escrever, apanhei lápis e papel no criado mundo, e as palavras me vieram, mas a mão não soube traduzí-las.
Tremi.
Rasguei o papel, joguei o lápis no chão, eu tive uma ideia, uma ideia que ia mudar o mundo, eu sabia o significado da vida, eu me lembrei,
eu me lembrei de como se construía um castelo de areia, a cor dos olhos do meu melhor amigo de infância, eu me lembrei do gosto da boca do pai dos meus filhos no nosso terceiro encontro, a minha poesia favorita e como engolir.
Eu me lembrei, e todo o meu corpo despertou num dia estranho, numa casa estranha, eu senti um medo quase paralisante de me olhar no espelho e descobrir que o pior havia acontecido.
Descobrir que eu tinha me esquecido.
Eu me levantei da cama aos poucos, eu fiz uma dança rígida, procurei uma roupa, eu estava viva, eu me lembrei, eu me lembrei, dancei e gritei ao som da música que o rubel cantou em um show que deve ter acontecido há uns 50 anos, eu era a moça que grita, eu queria amar de novo. Eu quero.
Ouvi passos lá fora, uma porta se abriu lá longe e eu sabia que era você, eu sabia porque eu sabia que só podíamos ter envelhecido juntos, mesmo que eu não conseguisse me lembrar dos detalhes, eu sabia, e eu queria te dizer que eu me lembrei, eu me lembrei de te amar e da nossa primeira dança lenta, do seu sorriso e do seu cheiro.
Fui até a porta pra te encontrar, mas minhas pernas fraquejaram e eu me esqueci como se andava, caí no chão, esqueci, eu esqueci como engolir a saliva e babei, não sabia mais abrir a boca, mas eu sabia escrever.
Eu sabia escrever, mesmo trêmula, eu sabia, eu precisava te dizer,
eu precisava que você soubesse.
Me arrastei, desesperada, até o papel e a caneta, mas, a dois passos curtos, emus braços e mãos se esqueceram o que era movimento, o corpo me traiu, virou um peso morto pra minha mente leve e eu chorei, jogada no chão, toda torta, fiz ruídos desconexos de palavras que minha mente conhecia, mas minha boca não sabia dizer.
E foi aí que você entrou, um minuto atrasado, trazendo seu cheiro, sua voz e uma juventude que eu não esperava. Era você e não era, era eu também, nos olhos de um estranho completo, tão familiar que eu podia jurar que era parte de mim.
Não era você,
era nós, a personificação de nós dois.
- Mãe?! O que aconteceu?
Eu tentei responder, eu tentei perguntar o nome dele, eu precisava saber, eu queria saber o que houve com você, o que houve comigo, mas ele não me respondeu, me pegou no colo, colocou na cama e me limpou, me cobriu.
Tentei chamar a atenção dele, eu queria saber, "eu estou aqui, eu me lembro", tentei dizer.
Mas o corpo, implacável, apagou as luzes aos pouquinhos,
apagou os primeiros anos, os meses, semanas, dias, amores, mágoas, meu primeiro beijo, citações, seu rosto. Apagou o seu rosto.
E, só então, apagou o meu, minha personalidade rude, minha preferência por Hershey's de amendoim e cajá-manga,
apagou tudo, tudo
de forma tão brutalmente eficaz
que eu me esqueci até
como é que se lembra.
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numa aula
39x12 Something just like this
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Minha gipsy põe as cartas na mesa.
Rei de espadas, de novo.
Eu tô pensando no que importa de verdade, no que importa agora.
É maio, a gente tem que pensar nas coisas, tudo tem que mudar, se eu quiser que mude, certo?
- Mas você quer?, ela pergunta.
Eu quero.
Que loucura, eu quero.
Eu quero exatamente esse momento, e eu não quero mais esperar por ele porque ele pode estar esperando por mim.
Eu quero o ponto fixo no tempo onde "Espere" adquire um significado mais amplo.
Eu quero pegar meu carro e ir até a sua casa.
Eu quero ver o pôr do sol na chuva e me lembrar do seu nome.
Saber o gosto da sua boca de cor.
Eu quero dirigir enquanto você dorme, pra longe de tudo, te deixar bilhetes em lugares secretos e te mostrar minha canção favorita.
Vamos tomar banho no escuro,
e eu vou te contar um segredo que nunca contei a ninguém.
Não, não, não. Eu não posso deixar que você desperdice a oportunidade.
Vai doer no final, sempre dói.
E eu tô com medo também,
mas me dá a sua mão.
Senta comigo na calçada e não volta pra casa até amanhecer.
Eu vou te proteger do mal e do escuro, das fadas malvadas que comem crianças e do que fica à espreita quando você acorda no meio da noite, eu vou derrotar os monstros nos seus sonhos e o seu medo de ter um relacionamento que vai acabar em traição.
Eu vou te contar coisas, você vai me contar coisas
e elas não vão me sufocar,
porque a gente vai abrir espaço, empurrar as pessoas, as paredes e as fronteiras, um oceano inteiro no fim do caminho
pro outro poder respirar.
Um oceano inteiro no jardim, que eu vou atravessar a nado, se for preciso
só pra te buscar.
Ou algo do tipo.
Eu não sei onde você 'tá, se você tá ferido, com frio, sozinho. Eu não sei se você tá bem.
Mas eu tô indo te buscar.
Eu não sei como, nem quando, nem onde, nem nada.
Mas eu tô indo te buscar.
Eu prometo.
Minha gipsy põe as cartas na mesa.
Rei de espadas, de novo.
Eu tô pensando no que importa de verdade, no que importa agora.
É maio, a gente tem que pensar nas coisas, tudo tem que mudar, se eu quiser que mude, certo?
- Mas você quer?, ela pergunta.
Eu quero.
Que loucura, eu quero.
Eu quero exatamente esse momento, e eu não quero mais esperar por ele porque ele pode estar esperando por mim.
Eu quero o ponto fixo no tempo onde "Espere" adquire um significado mais amplo.
Eu quero pegar meu carro e ir até a sua casa.
Eu quero ver o pôr do sol na chuva e me lembrar do seu nome.
Saber o gosto da sua boca de cor.
Eu quero dirigir enquanto você dorme, pra longe de tudo, te deixar bilhetes em lugares secretos e te mostrar minha canção favorita.
Vamos tomar banho no escuro,
e eu vou te contar um segredo que nunca contei a ninguém.
Não, não, não. Eu não posso deixar que você desperdice a oportunidade.
Vai doer no final, sempre dói.
E eu tô com medo também,
mas me dá a sua mão.
Senta comigo na calçada e não volta pra casa até amanhecer.
Eu vou te proteger do mal e do escuro, das fadas malvadas que comem crianças e do que fica à espreita quando você acorda no meio da noite, eu vou derrotar os monstros nos seus sonhos e o seu medo de ter um relacionamento que vai acabar em traição.
Eu vou te contar coisas, você vai me contar coisas
e elas não vão me sufocar,
porque a gente vai abrir espaço, empurrar as pessoas, as paredes e as fronteiras, um oceano inteiro no fim do caminho
pro outro poder respirar.
Um oceano inteiro no jardim, que eu vou atravessar a nado, se for preciso
só pra te buscar.
Ou algo do tipo.
Eu não sei onde você 'tá, se você tá ferido, com frio, sozinho. Eu não sei se você tá bem.
Mas eu tô indo te buscar.
Eu não sei como, nem quando, nem onde, nem nada.
Mas eu tô indo te buscar.
Eu prometo.
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39x11 The breakfast club
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garota solteira procura,
Imagem: TingTing Huang
Aperto o interfone, a voz de Larissa me deixa subir: eu trago oferendas, pão, leite.
Tô feliz, é dia de reunião de família.
Família antiga, desajustada, minha, entro na casa imaculada, branca, clara feito hospital, cheiro de desinfetante.
Cumprimento a empregada com um bom dia que eu acredito ser simpático e ela sorri, devolve.
dia bom, dia diferente, sem drama, sem coisas quebradas, todos de banho tomado, até mesmo eu.
Entro na cozinha, não tem abraços, mas todo mundo sorri pra todo mundo. Larissa, magra feito um espeto, corta frutas na bancada. David pega queijo na geladeira, peito de peru, ele parece animado, sempre animado.
Falta gente na nossa reunião, sobram lugares à mesa, Sofia, Al, Ulrika, Marcela, Gideon. Felipe. Mas não falamos sobre eles.
Só dessa vez, só hoje, queremos ficar estáveis.
Só hoje, Larissa finge que não tem medo de altura, velocidade, de certas cores e assuntos. David fica manso, relaxa, deixa caírem as barreiras.
E eu finjo que tá tudo bem, que eu não consigo ouvir mais nada, que eu não sei de nada.
Comemos, até explodir. Larissa me conta sobre esse livro que está lendo, David me pergunta sobre coisas amenas, minha família, minha escrita, só uma família de margarina tomando café da manhã, sem um pingo de sangue pra manchar o chão.
É tão normal, tão natural, tão bonito que eu quase acredito.
Eu quero acreditar na nossa estabilidade, na nossa capacidade de ficar assim, exatamente assim, e eu não quero voltar pra casa, eu não quero sair desse lugar, eu quero ser presa aqui também, no seu manicômio de luxo, onde eu posso ser normal.
Onde o normal é ser assim, onde tudo é claro, ninguém me toca, ninguém me força, ninguém finge saber o que tá acontecendo na minha cabeça.
Mas a comida acaba mais rápido do que deveria, o domingo de manhã escorre por entre os nossos dedos e meu telefone já apita, já me chama de volta. Só que eu não quero voltar.
Nos despedimos, Larissa me abraça forte e ela cheira tão bem, não tem cheiro de medo, de suor, de álcool. David me beija a testa, me oferece a força que um dia eu já tive.
Eu só quero sobreviver até o próximo domingo.
Eles entendem, sem que eu precise dizer e me cobrem de beijos, de até logos, de obrigadas, de voltes, de qualquer coisa que só quem conhece esse tipo de insanidade consegue passar.
Uma vontade gigante, desesperadora, de conseguir chegar até o próximo ponto fixo.
- A gente se vê? - ela me diz.
E eu aceno com a cabeça, várias vezes.
Ela acena também.
A gente se vê.
A gente consegue.
A gente sempre consegue.
Aperto o interfone, a voz de Larissa me deixa subir: eu trago oferendas, pão, leite.
Tô feliz, é dia de reunião de família.
Família antiga, desajustada, minha, entro na casa imaculada, branca, clara feito hospital, cheiro de desinfetante.
Cumprimento a empregada com um bom dia que eu acredito ser simpático e ela sorri, devolve.
dia bom, dia diferente, sem drama, sem coisas quebradas, todos de banho tomado, até mesmo eu.
Entro na cozinha, não tem abraços, mas todo mundo sorri pra todo mundo. Larissa, magra feito um espeto, corta frutas na bancada. David pega queijo na geladeira, peito de peru, ele parece animado, sempre animado.
Falta gente na nossa reunião, sobram lugares à mesa, Sofia, Al, Ulrika, Marcela, Gideon. Felipe. Mas não falamos sobre eles.
Só dessa vez, só hoje, queremos ficar estáveis.
Só hoje, Larissa finge que não tem medo de altura, velocidade, de certas cores e assuntos. David fica manso, relaxa, deixa caírem as barreiras.
E eu finjo que tá tudo bem, que eu não consigo ouvir mais nada, que eu não sei de nada.
Comemos, até explodir. Larissa me conta sobre esse livro que está lendo, David me pergunta sobre coisas amenas, minha família, minha escrita, só uma família de margarina tomando café da manhã, sem um pingo de sangue pra manchar o chão.
É tão normal, tão natural, tão bonito que eu quase acredito.
Eu quero acreditar na nossa estabilidade, na nossa capacidade de ficar assim, exatamente assim, e eu não quero voltar pra casa, eu não quero sair desse lugar, eu quero ser presa aqui também, no seu manicômio de luxo, onde eu posso ser normal.
Onde o normal é ser assim, onde tudo é claro, ninguém me toca, ninguém me força, ninguém finge saber o que tá acontecendo na minha cabeça.
Mas a comida acaba mais rápido do que deveria, o domingo de manhã escorre por entre os nossos dedos e meu telefone já apita, já me chama de volta. Só que eu não quero voltar.
Nos despedimos, Larissa me abraça forte e ela cheira tão bem, não tem cheiro de medo, de suor, de álcool. David me beija a testa, me oferece a força que um dia eu já tive.
Eu só quero sobreviver até o próximo domingo.
Eles entendem, sem que eu precise dizer e me cobrem de beijos, de até logos, de obrigadas, de voltes, de qualquer coisa que só quem conhece esse tipo de insanidade consegue passar.
Uma vontade gigante, desesperadora, de conseguir chegar até o próximo ponto fixo.
- A gente se vê? - ela me diz.
E eu aceno com a cabeça, várias vezes.
Ela acena também.
A gente se vê.
A gente consegue.
A gente sempre consegue.
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