Imagem: TingTing Huang
Deito no chão de madeira, fecho os olhos.
O professor me pede pra imaginar coisas, meditar.
Não consigo.
Mente a mil por hora, acelera até a velocidade da luz, eu tô quicando.
Durmo, e isso é um bom sinal.
Ou não?
Não sei, porque durmo 14 horas seguidas, depois acordo e não consigo ficar acordada.
Meu médico dizia que, se eu tô dormindo, então é um bom sinal, nesse contexto.
Mas não sei se é.
Eu tô doente?
Pego o telefone, mas não tenho pra quem ligar.
Tô sentindo
Tô me sentindo fragmentar, como se meus dedos estivessem se separando do meu corpo, como se meu cérebro corresse em direções diferentes, minha boca, meus olhos caem enquanto corro e vou deixando pedaços de mim pelo caminho torto que sigo.
Eu sento.
Respiro fundo, 1,2,1,2,1,2
Mas não adianta, adianta?
Eu sinto isso vindo na minha direção, como se eu pudesse prever uma batida de carro fatal, eu a vejo vindo e isso me deixa agoniada.
Durmo.
Durmo, durmo, durmo, durmo, durmo, durmo, durmo
Faço listas.
Faço listas o tempo todo, começo a criar regras novas, regras pras coisas, pras pessoas, eu preciso de regras, eu preciso ficar aqui nesse quadradinho, estável, completamente estável, segura e sã. Não posso sair, não posso sair.
Durmo.
Tenho que estudar, mas não estudo.
Eu não quero estudar.
E isso me deixa agoniada, porque eu não quero.
Porque tocar nos livros me dá engulhos, eu não quero.
Minhas unhas caem, meu nariz ferido solta casquinhas e eu começo a fazer listas
Faço listas
e mais listas
Febril, no meio da madrugada, eu respondo à perguntas que ninguém me fez, eu encontro padrões.
Depois durmo e falto às aulas e volto, dou risada
Depois tô de mau humor, não quero que me toquem, não quero que me toquem, não quero que
Ligo pra L., em desespero, números desenhados na pele do corpo inteiro, em todas as partes que consegui alcançar e como vai doer pra tirar tudo até amanhã de manhã
Ela me diz, como sempre, "por que você não se corta, como uma pessoa normal?", daí a gente ri, porque essa piada nunca fica velha.
Mas eu digo a ela, eu digo a ela que eu tô me fragmentando, explico que, debaixo da minha pele tem alguma coisa estranha acontecendo, que o gosto na minha boca não é de algo que eu comi, que--
E ela reconhece o padrão. Respira fundo e me diz, daquele jeito dela, pra não sair de casa, que ela tá vindo.
Mas eu não tô em casa, L.
Tô no meio da rua, tentando pegar meu braço esquerdo do chão.
Tiro uma nota ruim, tenho um dia ruim, uma mulher grita comigo.
Tantas regras, tantas listas
E eu não consigo ficar aqui, estável.
Eu não consigo fechar os olhos.
Holden me manda mensagem e ele sabe.
Eu não sei como ele sabe, eu nem sei se eu sabia até agora.
Mas ele sabe,
ele sabe mesmo sem ter me visto assim, sem dedos, sem braço, completamente desconectada.
Eu tento dizer que tudo bem, meu bem,
isso já aconteceu antes. Muitas vezes, incontáveis.
E eu tô aqui. Eu tô bem. Eu vou ficar bem.
Mas ele sabe.
Sabe, eu estou fazendo algo errado.
E eu não sei o que é.
Eu não consigo ver onde é que eu tô errando.
Porque eu erro quando acordo de manhã, e quando durmo demais.
Quando vou a todas as aulas e estudo e me aplico, eu erro quando mato aulas pra descansar, eu erro quando fico, quando vou pra casa, quando tô junto, quando tô sozinha, eu estou fazendo algo muito errado
Eu tô tentando ficar aqui, nesse quadrado estável, seguro. Eu só tô tentando fazer isso, não experimento coisas novas, eu repito as receitas, as fórmulas de ficar bem, mas elas não querem funcionar.
Nada nunca funciona.
Porque parece que tá tudo bem,
aí eu durmo
aí eu não durmo
faço listas
escrevo números
e, mesmo assim,
meu corpo se parte em pedaços
mas eu continuo correndo
sempre correndo
No final, sempre fica tudo bem.
Ou não.
38x05 Nau frágil
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