Imagem: TingTing Huang
Caro David,
eu não sinto dor.
Eu não sinto nada.
Sempre achei que fosse estar satisfeita quando esse momento chegasse, mas não estou, eu nunca estou.
Um homem me disse que o luto tinha acabado.
Me disse pra voltar pra casa, doar as roupas velhas do meu marido morto, pra jogar fora os papéis, sua escova de dentes, parar de dormir com suas camisetas. Pra tirar a aliança.
Ele me disse pra aceitar, e eu percebi que eu não tinha mais que aceitar nada. Tudo já me tinha sido imposto: aprendi pela pedra.
Casca grossa, dura. A vida andou me lixando e me deixou assim, não tenho como chorar, não tenho razão pra ficar ou pra responder a mensagem, eu não quero encontros furtivos, eu não quero migalhas e não quero uma tábua de ouija. Eu não quero não ouvir a verdade, eu não quero não encarar de frente o que eu não queria ver, o que eu não queria saber.
Eu não tenho força de vontade pra fechar a boca, e engulo seco o que suponho ser a exata dose que eu posso aguentar.
Fumo um cigarro, só um. Só um, pros dias ruins de verdade.
Pego um saco de lixo, e vou colocando as coisas dele, uma por uma, uma por uma.
Tá na hora de seguir em frente, de parar de achar que isso é tudo o que eu mereço.
Encho o saco, tô com o saco cheio, tô de saco cheio
e jogo tudo em cima do guarda-roupas, por receio de jogar fora.
Ainda não.
Não é que eu vá me arrepender, só tô dando um passo de cada vez, quero fazer tudo de caso pensado.
O verão tá chegando ao fim, e o luto também.
Mal posso esperar pela chegada do outono.
Entende o que quero dizer?
Com amor,
B.
38x06 Limpeza de outono
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